Branding não é uma ciência exata. As variáveis para a gestão de uma marca são muitas, e estão ancoradas no imprevisível comportamento humano. Por isso, tentar estabelecer leis, regras ou modelos fechados e replicáveis para a gestão de marcas quase sempre acaba se tornando uma tarefa inglória.
No entanto, marcas são ativos que impactam a performance da empresa, de acordo com sua capacidade maior ou menor de mudar comportamentos. Por isso, não se pode abrir mão de gerenciá-las, deixando sua performance ao sabor do mercado, da percepção externa.
Se não existem leis, pelo menos podemos identificar algumas práticas comuns entre as marcas de sucesso. São iniciativas e posturas estratégicas que criam fundamentos consistentes para que as marcas possam se tornar referência em sua categoria e mudar a dinâmica do mercado de maneira favorável à empresa. Nesse artigo, listo seis práticas que marcas vitoriosas no mercado brasileiro adotaram e que fizeram a diferença.
A seguir, estão listadas seis práticas que marcas vitoriosas no mercado brasileiro adotaram e que fizeram a diferença.
1 – Partir da identidade: propósito
O atributo mais comum entre marcas fortes, entre todos os grandes “cases” de branding, é ter uma visão crítica, questionadora, sobre o mercado. Esta prática de branding reverteu a lógica do marketing tradicional, de que o cliente conhece suas próprias necessidades e, portanto, bastava perguntar a ele.
Na verdade, quando todos os concorrentes vão em busca da mesma fonte, e esta fonte responde o mesmo para todos, o mercado chega a um nível paralisante de semelhança entre suas ofertas. Todos começam a fazer igual, sempre ancorados na defesa de que “foi o cliente que pediu”.
Para fugir desta dinâmica perversa, algumas marcas descobriram que poderiam contrariar e questionar o que o mercado dizia. Quando uma marca conhece seu mercado e tem um propósito, uma opinião, ela tem condições de propor o novo, o inesperado. E é isso que os clientes esperam: um especialista que possa trazer o que existe de novo.
Quando a NATURA questionou o paradigma de que cosméticos deveriam esconder a realidade e fazer promessas falsas, ela criou a inovação verdadeira. Sua primeira assinatura – “Verdade em cosmética” – traduzia uma crença profunda de seus fundadores.
Não era um posicionamento tradicional de mercado, um insight. Toda a empresa estava voltada para entregar esta crença na prática.
Como, por exemplo, na revolucionária campanha de Chronos, “Mulher bonita de verdade”, que utilizava modelos reais, mostrando suas identidades reais e falando de benefícios verdadeiros de um creme antissinais – não de um “anti-idade”.
Anos mais tarde, quando a marca concorrente DOVE iniciou uma campanha muito parecida, pela “Real beleza”, não era mais inovadora e não chegou perto do impacto de sua concorrente brasileira.
A complexidade desta prática é que ela demanda uma mudança de postura organizacional. Em outras palavras, precisa partir de um visionário, que muitas vezes se encontra na posição de fundador ou acionista. Não é uma prática que o departamento de marketing consiga conduzir de forma isolada. Não se trata de imagem, de comunicação, mas de uma identidade e propósitos claros.
2 – Experiência – ponto de contato
Uma marca só acontece de verdade e se torna real quando interage e entrega uma experiência a seus públicos, em qualquer que seja o ponto de contato – e não apenas pela via da comunicação.
O branding sempre procura conduzir a marca, de seu pensamento inicial, sua intenção estratégica, até seu “momento da verdade”. Uma marca não existe apenas na cabeça de seus gestores, na intenção de realizar algo ou passar uma mensagem bonita. Ela precisa ir para o mundo real e mudar comportamentos de clientes, prospects, funcionários, investidores, governos, imprensa, entre outros.
Algumas marcas, com o uso intensivo da comunicação, ficam apenas no discurso, em um passo anterior, que é sua promessa. Mas o que chamamos de mundo real? É o momento de entrega concreta de sua promessa, em uma experiência de interação que confirme na prática o seu discurso.
Quando uma marca pensa em experiência, ela olha para múltiplos meios e plataformas. Por exemplo, quando o Shopping Iguatemi pensa em uma experiência superior de varejo, olha além da comunicação publicitária. Tudo se volta para a interação com o cliente: suas lojas, espaço físico, sinalização, conceito, anúncios, fachada, segurança e serviços. E vai além: estar no Iguatemi é fazer parte de um estilo de vida, de um jeito de ver o mundo e se relacionar.
3 – Pensar em vários públicos ao mesmo tempo
Uma grande mudança de nossa época, alavancada pela tecnologia da informação e convergência de meios, é a obrigatoriedade de atuação com diversos públicos ao mesmo tempo.
Foi-se o tempo em que empresas decidiam falar com um público e ignorar os demais. Atualmente, as pessoas passaram a assumir, de forma natural, diferentes papéis em sua relação com as marcas. Alguém pode ser cliente e ao mesmo tempo um formador de opinião, um jornalista. Pode ser um colaborador e um investidor.
Por isso, a marca se torna importante, como origem e referência comum de todas as mensagens. Não importa com quem a empresa esteja falando, não importa a situação: a mensagem precisa fazer sentido e ser consistente para qualquer público. Sem uma mensagem alinhada, a marca corre o risco de se tornar “esquizofrênica”, enviando mensagens diferentes para cada público – por exemplo, dizer aos colaboradores que precisam se esforçar mais porque será um ano difícil e, ao mesmo tempo, anunciar perspectivas positivas a seus investidores.
A VALE construiu um dos maiores cases de reputação corporativa do Brasil, quando percebeu que sua imagem não deveria ser construída apenas junto ao público tradicional, os clientes. Na verdade, um cliente de minério na China pode dar pouca importância à marca. Mas para operar com segurança, com o “goodwill”, conquistar seus demais públicos, a VALE entendeu e passou a levar sua mensagem de progresso e sustentabilidade a formadores de opinião, governos de todas as esferas, ONGs, colaboradores, mercado de talentos e fornecedores.
4 – Linguagem integrada
Perceber que a todo momento sua marca está “conversando” com seu público é uma prática central em branding. Toda marca possui uma estática, ou seja, emite sinais visuais e de comportamento para seus públicos, buscando construir uma imagem. Esta linguagem aparece na comunicação publicitária, em um aloja, em uma maneira de atender um cliente ou responder a uma reclamação. Em todas estas manifestações, uma linguagem está sendo formada.
Quando passa a se preocupar com esta linguagem, uma marca passa a olhar para todas as suas manifestações, além da comunicação institucional. Por exemplo, descobre que o atendimento é uma manifestação estática, ou seja, transmite sinais comportamentais e visuais que contribuem para a consistência de sua imagem.
O BANCO ITAÚ descobriu isso há muito tempo. O alinhamento estético/visual de todos os seus pontos de contato, das agências à sua comunicação digital, garante uma presença de marca ímpar, com reconhecimento imediato. Isso permitiu à marca ITAÚ alcançar um objetivo de sonho para as marcas: apropriar-se, imageticamente, de uma cor – no seu caso, o laranja. Hoje quando vemos um filme publicitário utilizando intensivamente a cor laranja, por exemplo, antes de ver o anunciante, sabemos de quem se trata.
5 – Relevância de conteúdo
Vivemos em um contexto de excesso de informação e de oferta. Temos muitas opções de escolha para quase tudo o que demandamos, mas também muito pouco tempo para exercer estas escolhas.
Por isso o indicador-chave em branding é relevância, ou, em outras palavras, percepção de valor. Uma marca pode buscar ser conhecida e top of mind, por meio de comunicação intensiva; ou se diferenciar, através de um posicionamento bem definido e pesquisado. Mas isso o ferramental de marketing sabe resolver.
No entanto, entre uma marca conhecida, diferente, genial, engraçada, e uma marca relevante, esta última vai prevalecer. Apenas uma marca relevante pode levar os públicos da empresa, principalmente o cliente, a mudar seu comportamento. É a relevância que transforma potenciais em futuros clientes reais; que torna um cliente mais leal e permite maiores margens; que atrai e mantém talentos; que transmite confiança e investidores.
A marca BRAHMA, mesmo não sendo corporativa, soube aumentar a relevância ao longo dos anos, em um mercado ultracompetitivo. Sua relevância vem através de dois elementos: conexão máxima com seu público, o “brahmeiro”, desde seu comportamento, seu jeito de pensar, até a presença em seu momento de lazer – o futebol. A BRAHMA construiu uma posição de relevância e ao mesmo tempo de diferenciação, que são alavancas fundamentais de preferência e, consequentemente, de vendas.
6 – Marca e negócio são uma coisa só
Por fim, mais que uma prática, uma das maiores força que encontramos em marcas de sucesso é o reconhecimento, por parte da alta gestão, de que a marca representa e alavanca o negócio como um todo. É um ativo da empresa, e não uma logomarca gerenciada pelo departamento de marketing.
Quando a empresa se manifesta, em qualquer iniciativa, a imagem da sua marca será impactada, tornando-se a depositária de percepções positivas – ou negativas. A separação tradicional dos objetivos “de negócio” e “de marca” levou a um afastamento da agenda dos presidentes em relação ao pessoal de marketing e comunicação. Mas, apesar de tentar ser didática, esta separação era falsa. Quando um presidente ou diretor de relações com investidores dá uma entrevista, está contribuindo, para o bem ou para o mal, para a reputação da empresa. E esta reputação é sustentada, referenciada, pela marca.
A noção de que marca e negócio são dois lados da mesma moeda tem levado, por exemplo, o pessoal do departamento de RH nas empresas a falar em branding, em atributos de marca, em posicionamento. Claro: eles são responsáveis por construir a imagem da marca para um público crucial, o público interno.
A TELEFÔNICA VIVO tem certeza sobre isso. As diretrizes estratégicas de suas marcas sempre procuram abranger e fazer sentido para todos os públicos.
Seus valores são tratados como valores de marca, que devem mudar comportamentos, e não algo abstrato, em um quadro na parede. Isso cria um nível de consistência e atratividade difícil de ser combatido pelos concorrentes.
Muito além das práticas vitoriosas
O Branding pode ser considerado como o trabalho de construção e gerenciamento de uma marca junto ao mercado. A construção de uma marca forte para um produto, uma linha de produtos ou serviços é consequência de um relacionamento satisfatório com o mercado-alvo. Quando esta identificação positiva se torna forte o bastante, a marca passa a valer mais do que o próprio produto oferecido.
Sua execução não é tomada apenas por ações de marketing que posicionam a marca e divulgam a marca no mercado, mas também por ações internas na empresa, transmitindo, para todos os interessados, a imagem pretendida.
Objetivo do branding é, entre outros, aumentar o brand equity e assim aumentar o valor da empresa em si.
Fonte: Harvard Business Review