Algumas empresas de vanguarda conseguiram fazer com que o serviço pós-venda passasse de um centro de custo a uma vantagem competitiva.
Numa empresa de alta tecnologia, 10% do faturamento é proveniente do serviço pós-venda, e isso corresponde a 100% do lucro. Lucrar mais com os serviços do que com as vendas propriamente ditas não é tão incomum quanto se imagina. Como conseguir isso? Segundo o consultor da A.T. Kearney que escreveu este artigo, “a resposta deve ser dada em duas partes. Em primeiro lugar, as empresas precisam criar uma estratégia de serviços voltada para o cliente que gere receitas e lucros significativos e crescentes. Em seguida, elas têm de executar essa estratégia de forma a ampliar significativamente a eficiência e aumentar a retenção de clientes a longo prazo”.
Para formular uma estratégia de serviços correta, toda empresa deve tomar quatro providências principais:
- 1) segmentar o mercado de acordo com as qualidades que são importantes para atuais e potenciais consumidores,
- 2) comparar sua oferta e sua capacidade de serviços com as de seus concorrentes,
- 3) entender o poder e as limitações dos vários canais disponíveis para o marketing e
- 4) desenvolver um sistema de precificação de serviços que leve em conta tanto as estratégias baseadas em produtos como a economia do ciclo de vida.
Já a execução eficaz dessa estratégia implica as seguintes ações-chave:
- 1) gerenciar os contatos com os clientes para aumentar a eficácia e a eficiência,
- 2) estruturar a organização para esta ser mais voltada para o cliente,
- 3) gerenciar a força de trabalho para atender à demanda de modo confiável e eficaz,
- 4) construir a competência de seu pessoal e
- 5) gerenciar o desempenho para equilibrar custos, qualidade e atendimento.
Onde reside o maior potencial de lucro de uma empresa? Muitas vezes não é nas vendas. Vejamos este exemplo de uma empresa de alta tecnologia: 10% de seu faturamento é proveniente do serviço pós-vendas, e isso corresponde a 100% do lucro total. De maneira semelhante, no caso de uma empresa aeroespacial líder de mercado, os serviços de pós-venda constituem 20% da receita de vendas anual e representam cerca de 95% do total dos lucros.
Cada vez mais o serviço pós-venda é reconhecido como parte integrante da cadeia de valor. Ele cria valor econômico, uma vez que freqüentemente representa a melhor oportunidade de maior margem de lucro. Também mostra ser um excepcional mecanismo para reunir informações sobre os clientes e acompanhar o desempenho dos produtos. E, quando ajustado apropriadamente, serve de plataforma sobre a qual as empresas podem alimentar fortes e crescentes relacionamentos com seus mais desejados clientes –os lucrativos.
Empresas que superam as expectativas em suas atividades de pós-venda também conseguem aumentar a lealdade dos clientes e sua retenção de longo prazo –um benefício significativo, uma vez que o custo de conquistar um novo cliente é estimado em três a seis vezes o custo de manter um cliente. Apesar desse custo, muitas companhias perdem mais da metade de seus clientes a cada cinco anos. Pelo fato de os serviços serem menos suscetíveis à comoditização, eles oferecem às empresas a oportunidade de estancar a deserção dos clientes e promover a extensão da marca.
Atualmente, as empresas encaram o serviço pós-venda do ponto de vista estratégico e lhe conferem a atenção e o nível de investimento necessários. No entanto, o maior desafio são os chamados “últimos cem metros” da corrida, ou seja, a capacidade de fornecer ao consumidor os resultados prometidos. E, como experiências recentes em varejo eletrônico têm demonstrado, esses últimos cem metros podem acabar se mostrando uma estrada longa e pedregosa.
Como uma empresa transforma seu departamento de serviços, fazendo com que passe de um centro de custo (ou um fraco participante do negócio) a uma fonte valiosa de vantagem competitiva? Como a potencial troca de informações obtida com o e-business consegue modificar sua capacidade de prestar serviços?
A resposta deve ser dada em duas partes. Em primeiro lugar, as empresas precisam criar uma estratégia de serviços voltada para o cliente que gere receitas e lucros significativos e crescentes. Em seguida, elas têm de executar essa estratégia de forma a ampliar significativamente a eficiência e aumentar a retenção de clientes a longo prazo (veja quadro com figura 1 na página 120).
As empresas líderes alinham seus processos internos em torno das expectativas e da satisfação do consumidor. Elas criam um ambiente voltado para a lealdade e a retenção de clientes. Concentram-se em ser as “melhores da classe” em satisfação dos clientes. E, finalmente, desenvolvem parâmetros de negócios com base em relacionamentos e lucratividade de longo prazo, em vez de focalizar transações isoladas.
Como direcionar a estratégia para serviços
Desenvolver uma estratégia que antecipe e atenda com sucesso às necessidades pósvenda dos consumidores é uma tarefa complexa. Como em todas as demais facetas dos negócios nos dias de hoje, a Internet está condicionando a abordagem dos presidentes de empresa em relação à área de serviços, forçando-os a explorar as maneiras como o mundo eletrônico, ou simplesmente o “e”, afeta sua vantagem competitiva.
O primeiro passo em direção à excelência nos serviços é criar uma estratégia de serviços que esteja bem “amarrada” à estratégia corporativa da companhia. Embora o planejamento de cada empresa dependa de circunstâncias únicas/específicas, as seguintes ações são sempre cruciais:
- Segmentar o mercado de acordo com as qualidades que são importantes para atuais e potenciais consumidores.
- Comparar sua oferta e sua capacidade de serviços com as de seus concorrentes.
- Entender o poder e as limitações dos vários canais disponíveis para o marketing.
- Desenvolver um sistema de precificação de serviços que leve em conta tanto as estratégias baseadas em produtos como a economia do ciclo de vida.
Ao segmentar a base de consumidores, é fundamental definir atributos claramente distintos. Os clientes podem, por exemplo, ser agrupados pelo critério de quão rapidamente eles esperam que um pedido seja atendido, ou por sua posição em relação a preço, ou mesmo por ambos. Em decorrência da necessidade de contato direto com o consumidor, na maioria dos casos, os aspectos geográficos têm sido tradicionalmente um dos primeiros fatores de segmentação escolhidos pelas empresas –e continuarão a ser um atributo importante. No entanto, determinar quais serão consumidores-alvo e que serviços oferecer é algo que requer a compreensão da lucratividade gerada pelo cliente –os clientes não contribuem de forma eqüitativa ou proporcional para o sucesso de um negócio.
As empresas que compreendem as nuanças do atendimento ao consumidor começaram a se mover em direção à personalização em massa há poucos anos, à medida que fizeram a personalização de seus produtos. Essa abordagem de fazer as coisas sob medida, entretanto, requer monitoramento ativo do uso do produto, acompanhamento acurado dos estágios de ciclo de vida e gerenciamento estratégico dos contatos com os clientes.
Somente as empresas capazes de gerenciar informações e de executar serviços –capacidades estas que lhes permitem operar em um nível bastante específico– vêm sendo bem-sucedidas. A maioria das outras continua utilizando métodos de segmentação mais tradicionais.
Em ambos os casos, é importante entender os impulsionadores do negócio principal para cada segmento (por exemplo, um cliente cujo automóvel está passando pelo setor de atendimento da empresa pode preocupar-se mais com custos e outro talvez priorize a minimização do tempo despendido) e construir uma base de conhecimento que permita a sua empresa comparar as necessidades daquele segmento com suas capacidades e recursos. A informação é essencial para a eficácia do serviço (que se pode traduzir na rapidez de resposta e em altos índices de acerto na primeira vez) e para sua eficiência. A informação é mais do que um elemento capacitador; ela é fundamental para aumentar o sucesso do serviço. E quanto mais falta faz um produto que quebra, mais valiosos são os canais de conteúdo informativo e de comunicação.
Com o advento dos portais B2B (business-to-business, ou negócios entre empresas) na Internet, os avanços da comunicação remota e a infra-estrutura de telecomunicações cada vez mais poderosa, a oportunidade de captar informações sobre o desempenho do produto nunca foi tão grande. Pense na vantagem de mercado de uma companhia de portões eletrônicos de alta tecnologia que consiga integrar um sistema remoto à unidade de sensor de cada portão. No caso de falha, a unidade automaticamente notificaria a base de serviços, permitindo que a equipe técnica da empresa agisse mais rapidamente a partir dessa informação. Essa capacidade efetivamente impediria os concorrentes de lhe roubar clientes.
As organizações de primeira linha entendem o valor que fornecem aos clientes com o serviço excelente e esforçam-se para empacotar as ofertas de serviço adequadamente. Tais empresas compreendem que a chave do serviço lucrativo está na capacidade de dividir as ofertas de serviços por grupos de clientes –e, mais importante, em obter um retorno razoável sobre os serviços fornecidos, um retorno que reflita o valor recebido pelo cliente.
Parece ser uma boa prática de negócio oferecer a maior variedade de serviços possível ao maior número de clientes possível. No entanto, essa abordagem não incentiva muito os clientes a optar pelos serviços premium. Por exemplo, um cliente de uma empresa de alta tecnologia contou o seguinte: “Quando preciso de um software com urgência, sempre consigo um apenas telefonando para o vendedor que me atende. Por que pagaria por esse tipo de serviço se eu já o recebo?”
Vemos o serviço como uma vantagem competitiva sustentável, porque barreiras de entrada geralmente são maiores do que barreiras para clonar um produto. Mas isso não significa que a concorrência forte não exista. Muitas empresas negligenciaram o serviço e, por isso, foi criado um vácuo que está sendo preenchido por prestadoras de serviços agressivas, não alinhadas. Em resultado, clientes valiosos se vão ou, no mínimo, optam por realizar os serviços de pós-venda com tais prestadoras. Para proteger seu mercado, é fundamental comparar suas ofertas de serviços com as de seus concorrentes e refocalizar as capacidades de modo a diferenciar suas ofertas e a gerar barreiras para a entrada de concorrentes nesse mercado.
A Internet cria novas oportunidades para o serviço eficaz por meio do gerenciamento eficaz da informação; ela também amplia a capacidade de colaborar com parceiros de serviços tradicionais. Por exemplo, um call center pode utilizar um sistema de diagnóstico que habilite alguns representantes a utilizar novas técnicas de e-business para identificar e resolver problemas a distância. Esses representantes podem mandar ao cliente a solução pela Internet (basta um download) ou enviar um “fornecedor de serviços”. A informação sobre os requisitos do serviço e o gerenciamento dessa informação devem ser tratados em canais diferentes quando apropriado.
Estabelecer preços de acordo com a estratégia também é vital. Uma política eficaz de precificação de serviços leva em consideração tanto estratégias baseadas em produtos como a economia do ciclo de vida. Mesmo os fabricantes de produtos que exigem tecnologia avançada, como os de turbinas de aeronaves, por exemplo, são suscetíveis a concorrentes intrusos quando o preço não é adequado.
A propriedade industrial de determinadas peças pode sustentar margens de lucro superiores, enquanto os componentes-padrão ou próximos do padrão são facilmente copiáveis. Além disso, um sistema de serviço excelente pode contribuir grandemente para o valor líquido de uma marca. Por sua vez, o valor líquido da marca pode levar ao desempenho superior da margem de lucro.
Execução eficaz e o caso Siemens CT
O diferencial competitivo de qualquer estratégia está na capacidade de execução. Levar a cabo uma estratégia de serviço pós-venda com eficácia é algo que requer o mesmo grau de comprometimento e atenção que o planejamento. Empresas líderes em excelência de serviços seguem as seguintes ações-chave:
- Gerenciam os contatos com os clientes para aumentar a eficácia e a eficiência.
- Estruturam a organização para esta ser mais voltada para o cliente.
- Gerenciam a força de trabalho para atender à demanda de modo confiável e eficaz.
- Constroem a competência de seu pessoal.
- Gerenciam o desempenho para equilibrar custos, qualidade e atendimento.
Ao gerenciar melhor os contatos com os clientes, os departamentos de serviços podem aumentar sua eficiência e satisfazer melhor –ou até exceder– as expectativas dos clientes. Coerência é outra questão fundamental. Os clientes devem receber o mesmo nível de serviço de todos os funcionários da empresa, assim como respostas coerentes entre si para todas as perguntas que fizerem, mesmo que mudem de um canal de comunicação para outro (por exemplo, do telefone para o e-mail).
Por meio do ativo gerenciamento das necessidades dos clientes no que tange a produtos ou serviços, a unidade de serviços de pós-venda pode atender à demanda de forma mais confiável. Quanto mais planejado e baseado em prevenção é o esquema de manutenção de uma empresa, menor é a necessidade de manutenções de emergência. Idealmente, as empresas deveriam gastar entre 80% e 85% de seus recursos em manutenção planejada, de rotina, e de 15% a 20% em serviços emergenciais. O simples ato de iniciar consertos mais cedo pode reduzir significativamente os danos colaterais (por exemplo, fazer manutenção nos freios de um carro evita que o carro seja todo amassado num acidente causado pela falha dos freios). Resultado final: seus clientes ficarão mais felizes porque seus produtos terão um desempenho mais consistente e ficarão menos tempo parados, e sua empresa contará com maior previsibilidade no agendamento de serviços, o que lhe possibilitará maior eficiência.
A força encarregada dos serviços em si geralmente é uma excelente fonte de informações sobre o que acontecerá com o desempenho dos produtos. Você envolve seus funcionários da unidade de serviços nos projetos de produtos? Os produtos são projetados para gerar receitas com serviços? Há um plano para que os produtos passem por programas de melhoria e atinjam um patamar de mais alto desempenho? Todas essas são áreas de oportunidades freqüentemente perdidas nos silos dos processos de desenvolvimento de produtos de muitas empresas.
Entretanto, os silos corporativos são apenas metade do campo de batalha –neste ambiente em rápida mutação, garantir a qualificação da força de trabalho com treinamento e programas de retenção é essencial para ter funcionários eficazes e “ligados” no negócio. Módulos de treinamento on-line e métodos de autotreinamento estão ganhando popularidade porque se prestam bem ao aprendizado contínuo exigido hoje no local de trabalho mutante. Mais ainda, esses métodos são mais acessíveis e mais fáceis de manter e atualizar, economizando o tempo e o dinheiro dos empregadores. À medida que uma empresa reforça seu foco no cliente, torna-se necessário estruturar sua organização para dar apoio ao novo foco.
A tecnologia de hoje dá vazão a inúmeras oportunidades de aumentar a produtividade. Manuais que podem ser “baixados” da Internet e sistemas de diagnóstico remoto reduzem o tempo que se leva para resolver um problema. Pense no exemplo da divisão de tomografia computadorizada da Siemens AG Medical Engineering, conhecida como Siemens CT, vencedora do prêmio “Excelência Global em Operações” conferido em 1999 pela A.T. Kearney.
Para fornecer uma solução completa em vez de simplesmente um produto, a Siemens CT se reestruturou, construindo uma organização horizontal baseada em processos, na qual cada processo foi projetado tendo o cliente em mente. Por exemplo, para preencher um pedido para um aparelho de raios X totalmente personalizado, a Siemens CT anota os requisitos definidos pelo cliente, cria o software, constrói a máquina, prepara a sala na clínica ou hospital onde a máquina ficará localizada e, finalmente, cuida da instalação, dos testes e do treinamento das pessoas. Tudo isso é parte de seu pacote completo de produto e serviço. A Siemens CT dá até um passo adiante, ao monitorar o desempenho do produto em ação utilizando a Internet e diagnósticos remotos para garantir que a máquina esteja funcionando dentro das especificações.
Mesmo a mais seleta estratégia e o modelo operacional escolhido a dedo dependem da capacidade de captar e gerenciar ativamente as informações sobre o desempenho de produtos. Sem isso, a eficácia e a eficiência dos serviços vão rapidamente erodir. Um bom programa de mensuração de desempenho deve ter foco bem definido e abranger a organização inteira. Além disso, as medidas escolhidas têm de ser específicas, baseadas em fatores críticos e controláveis e alinhadas com metas estratégicas. Também devem fornecer à empresa informações úteis que sejam relevantes para os resultados. Por fim, a informação sobre a mensuração do desempenho é um elemento-chave no treinamento –seja on-line ou autotreinamento–, uma vez que revela as áreas e habilidades que precisam de aperfeiçoamento.
De volta ao básico
Como você pode determinar onde se localiza sua organização no espectro da excelência nos serviços? A A.T. Kearney identificou quatro estágios de excelência para o cliente e suporte, que são tão relevantes para o e-business como para as empresas tradicionais (veja quadro acima).
No primeiro estágio, a empresa se concentra em conter custos e em lidar com solicitações de serviços de rotina.
No segundo estágio, a empresa se volta para fornecer um bom serviço aos clientes e começa a incorporar o feedback destes.
No terceiro estágio, a empresa coloca seu foco em melhorar os relacionamentos com os clientes e em integrar e distribuir as informações sobre eles.
Poucas companhias já atingiram o quarto e mais avançado estágio da excelência nos serviços, no qual os processos internos estão alinhados em torno da satisfação do cliente, o ambiente está voltado para a lealdade e a retenção, o foco principal é ser “o melhor da classe” em satisfação do cliente e a mensuração do negócio se concentra em relacionamentos e lucratividade de longo prazo em vez de em transações isoladas. Em resultado, a oportunidade surge para aqueles que se movem rápida e estrategicamente.
Para a maioria das empresas, a questão é como se mover mais ativamente para captar o valor total do negócio representado pelos serviços de pós-venda. Para aqueles que tirarem vantagem dessa janela de oportunidade, a questão logo será como aumentar ainda mais os lucros e sua distância como líder.
Se forem baseados em uma forte estratégia executada com eficácia, os serviços aos clientes podem ser a parte mais lucrativa de sua operação, trazendo resultados impressionantes –melhoras significativas na retenção de clientes a longo prazo, avanço no posicionamento competitivo das linhas do negócio principal e crescimento substancial e de longo prazo nas receitas de vendas e na lucratividade proporcionadas pelos clientes.
Fonte: Revista HSM Management, por Paul Inglis. Quando o artigo foi publicado, ele era vice-presidente de operações da firma de consultoria A.T. Kearney em Toronto, Canadá. Especialista em estratégia e execução de serviços, tem extensa experiência nos setores automobilístico e de produtos de consumo. Escreveu vários livros sobre logística e transporte.