Restaurante Fellini – Gestão com pessoas

Este case descreve o processo de gestão de pessoas do Restaurante Fellini. Um empreendimento familiar com prêmios da área de gestão de pessoas e atendimento ao cliente. Suas principais políticas de gestão de pessoas são apresentadas assim como o impacto na percepção de qualidade do restaurante. Ao final, os desafios são abordados no que diz respeito ao futuro de uma empresa familiar.

Introdução

O autor deste estudo foi visitar o restaurante no bairro nobre do Leblon. Lá chegando, foi recebido por seu principal gestor e fundador, Nelson Laskowsky. O ambiente agradável, a atmosfera de harmonia e tranquilidade não são ameaçados pela grande quantidade de clientes. Ao contrário, são reforçados. Durante o almoço, constantemente Nelson e sua esposa, Ana – nutricionista do restaurante – são abordados por clientes que mais parecem amigos. Os garçons extremamente educados e prestativos oferecem um “caldinho” antes do almoço: “cortesia da casa”, esclarece Nelson.

Mais adiante, conta-nos um fato surpreendente: “Um dos nossos garçons foi se casar e tivemos que alugar uma van para levar oito casais de clientes que foram ao casamento”. Fatos assim, dentre outros, provam ser o Fellini um lugar diferente. A conversa de mais de uma hora produz informação e a intenção de escrever mais de um estudo de caso sobre o restaurante. Nelson entusiasma-se com a ideia: “podemos aprender muito com alunos nos estudando e dividir um pouco de nossa história”. Essa história, permeada com ingredientes, como respeito às pessoas, amor pelo que se faz e disciplina, muita disciplina, é colocada para debate neste estudo de caso.

Histórico

O Restaurante Fellini, fundado na cidade do Rio de Janeiro em maio de 1993, é um sobrado de esquina situado numa rua tranquila do Leblon, na Zona Sul do Rio de Janeiro. Trata-se de bufê com cobrança a peso com uma proposta gastronômica e um atendimento diferenciado, em que os donos participam diariamente das operações. Formam uma base bem eclética de clientes principalmente pelo sistema de cobrança, que pela sua excelente relação custo-benefício atrai moradores, trabalhadores de empresas próximas e turistas. Destaque para o grande número de pessoas da terceira idade que busca o restaurante. E atrai tanta gente que são comuns filas na porta.

O que é que torna o Fellini especial a ponto de lotar os seus 150 lugares no almoço e no jantar, chegando a atender 800 pessoas por dia? “O segredo é nunca cair na mesmice”, resume o proprietário, Nelson Laskowsky. “Estamos o tempo todo experimentando novos pratos. Nosso bufê tem desde uma simples salada até iguarias finas, como lagosta, caviar ou escargot, não encontradas em cardápios a quilo. Investindo na gastronomia e na qualidade do serviço, conseguimos agradar e conquistamos uma clientela fiel”, complementa.

O restaurante não chegou por acaso até onde sonhara seu fundador. “Foi preciso trabalhar muito durante anos, até chegar aonde eu queria”, revela Nelson, carioca nascido e criado na Zona Sul, de família de classe média. Ele conta que nos tempos de estudante ganhou uma bolsa para fazer o curso de Administração na Universidade de Jerusalém. Lá, ficou morando numa república e foi trabalhar numa pizzaria. “Fui tudo, de lavador de panelas a pizzaiolo e caixa”. Quando voltou ao Brasil, em 1980, abriu em Madureira, na Zona Norte do Rio de Janeiro, uma pizzaria no sistema de fast-food (servida em pedaços). Não deslanchou. “Era o produto certo, no tempo certo, mas no lugar errado; era como vender galochas no deserto”, comenta. Decidiu tentar outra coisa, desta vez na Zona Sul.

Não existe “mico”

A oportunidade surgiu em 1993, quando Nelson descobriu o sobrado do Leblon, antes ocupado por um restaurante. Estava à venda por um preço ótimo, mas o ponto era considerado “micado”. Ele não se impressionou. “No começo me dei mal. Não redecorei a casa nem soube lançar o restaurante na mídia. Fazia uma boa comida, mas não tinha sucesso”, constata.

Foi aí que Nelson deu a virada na vida. “Vi que precisava ter humildade e reaprender”, lembra. Começou a visitar outros restaurantes, a observar os pontos fortes e fracos, participou de associações de restaurantes, inteirou-se de novas práticas através das revistas especializadas. Só então deu partida em seu projeto. Organizou a casa, mudou do sistema “à la carte” para o sistema de cobrança por peso, reformulou o cardápio para 80 opções a quilo; contratou bons chefs e até um sushiman, que prepara na hora especialidades da cozinha japonesa.

A concorrência

A concorrência ao redor do restaurante é ampla. Diversos restaurantes reconhecidos na cidade oferecem aos clientes as mais diversas opções em gastronomia e em qualidade de serviço. O Shopping Leblon com seus vários restaurantes está a poucas quadras. Restaurantes como Gula Gula, Zuka, Jobi, Le Coin-Gal San Martin, Giuseppe Grill Leblon, entre outros completam o quadro concorrencial do restaurante. Tamanha diversidade fez com que Nelson entendesse que se não tivesse uma oferta diferenciada, suportada por funcionários comprometidos e eficientes, não teria chance alguma. Não bastaria tentar ser igual ou melhor que os concorrentes próximos, ele teria de ser diferente.

Empresa familiar, gestão participativa

O Fellini tem 62 funcionários e a família divide a direção. Ana Maria, nutricionista, supervisiona o cardápio e o atendimento, e a mãe e sócia, Helena, ajuda a cuidar da parte financeira e do atendimento. Adepto da gestão participativa, Nelson promove reuniões com os funcionários para discutir o andamento dos negócios e oferece a eles vários incentivos, além do seguro médico e odontológico e remédios para toda a família, prêmio de produtividade pago na data do aniversario, cesta básica aos pontuais,empréstimos subsidiados, pagamento de cursos.

Quem dá uma boa ideia colocada em pratica recebe R$ 100,00. Tudo isso rendeu ao restaurante o “Prêmio Procon” de 1998. Essa troca de experiências é fundamental, há espaço para todos. “Acredito que um restaurante é o melhor lugar para se trabalhar e ganhar dinheiro – desde que se resolva arregaçar as mangas e fazer o máximo”, explica Nelson.

O carioca Nelson Laskowsky, 54 anos, tem uma rotina invejável: passa grande parte do tempo entre viagens internacionais, leituras sobre negócios e visitas a sites sobre administração na internet. Quando não está participando de feiras de alimentação pelo mundo afora, fica em casa, entretido com livros sobre Marketing e Gestão de Pessoas. Com isso, gasta suas horas tentando encontrar ideias que possam ser aplicadas na administração do restaurante. “Sou um felizardo”, diz Nelson. “Afinal de contas, tenho tempo para pensar”, conclui.

Pesquisa de marketing, gestão com pessoas e bom atendimento: ingredientes obrigatórios.

Mas não é só a gastronomia de qualidade que preza o Fellini. Em sua busca de informações, Nelson está encontrando meios para inovar na gestão do restaurante e conquistar a fidelidade de seus clientes. “Fazer comida linda é fácil”, diz. “O difícil é ter lucro.” Há alguns anos ele resolveu dividir a gestão com seus 62 funcionários. Para isso, criou um comitê que discute em reuniões quinzenais tudo o que acontece no restaurante.

Nas reuniões, os empregados também opinam sobre contratações e podem sugerir que alguém seja mandado embora por alguma falha grave. E todos têm um bom motivo para se preocupar com o dia a dia do Fellini: Quanto meIhor o desempenho do grupo maior será a distribuição dos ganhos entre eles. Com a equipe motivada fica mais fácil manter uma das características mais marcantes do Fellini: a obsessão pelo bom atendimento.

A preocupação em se manter empático com a clientela vai mais além. Pelo menos duas vezes por ano, Nelson faz uma pesquisa com dois mil clientes do Fellini. Num questionário especial, são feitas perguntas sobre a qualidade da comida, do atendimento e do ambiente. Todas as reclamações e sugestões são ouvidas. Na última pesquisa, mais de 50% das pessoas classificaram o restaurante como “excelente”. Ponto para o Fellini, que se beneficia do efeito multiplicador dessa avaliação. “Dê um sorriso todo dia e os clientes se tornam seus paladinos”, afirma Nelson.

Missão, valores e visão

O restaurante tem definidas suas diretrizes, transcritas a seguir:

MISSÃO: Satisfação dos clientes internos e externos, oferecendo um atendimento personalizado, uma equipe permanentemente treinada, com uma comida saborosa e saudável oferecida a preço justo num ambiente limpo e familiar.

VALORES: Acreditamos na conduta empresarial baseada em padrões éticos de integridade e transparência.

VISÃO: Acreditamos no atendimento diferenciado e personalizado consolidando-se como uma empresa de qualidade, que tem como objetivo reter e permitir que cresçam os colaboradores, oferecer um preço justo aos clientes e manter a empresa profícua. Provando ser possível ter uma operação em que todos possam se sentir vencedores.

FILOSOFIA DA EMPRESA: Por ter conquistado com muito trabalho no decorrer desses 17 anos de existência uma sólida imagem de ser um dos melhores restaurantes a quilo do Rio de Janeiro, essa liderança nos inspira e trás como mote procurar fazer melhor ainda do que foi feito no dia anterior.

Modelo de gestão de pessoas

A equipe de gestão acredita no atendimento diferenciado e personalizado para consolidar- se como uma empresa de qualidade, tendo como objetivos reter os clientes e permitir que os funcionários participem ativamente da gestão.

Pelo fato de a empresa não estar voltada para o crescimento através da abertura de novas filiais, o restaurante aproveita os funcionários como uma ferramenta de gestão de pessoas para manter a excelência em atendimento e qualidade dos serviços. Sempre enfrentaram os desafios ao longo dos anos para serem reconhecidos como o número 1 em gastronomia do Rio de Janeiro, seja no passado recente, no presente ou no futuro. “Nossas políticas de RH são comunicadas à equipe através de reuniões semanais”, afirma Nelson.

Prêmios

Empresa vencedora do prêmio Gestão com Pessoas em 2009, concedido pela ABRH-RJ, o restaurante ainda possui outros prêmios. O modelo de gestão do Fellini foi premiado pelo Procon em 2008, recebendo o Selo Varejo, concedido pelo SEBRAE e pela Associação Comercial do Rio de Janeiro. Mais ainda, foram ganhadores do Great Place to Work 2008 e pelo Prêmio FECOMÉRCIO 2008, como uma das empresas que mais se destacaram no seu segmento. Outro título que o Fellini ostenta é o de ser o primeiro restaurante exclusivo para não fumantes do Rio de Janeiro, o que rendeu também uma homenagem do Instituto Nacional de Combate ao Câncer em 2002. Indicado pelo júri da revista Veja Rio entre os destaques gastronômicos da cidade entre 2003 e 2006, além do Prêmio Água na Boca nos anos de 2001 e 2003 de melhor restaurante a quilo da Zona Sul.

Recrutamento e seleção

Quando é percebida a necessidade de um novo colaborador para o quadro, mais uma vez os funcionários são ouvidos: “Normalmente o recrutamento é feito primeiro com uma comunicação verbal a todos da equipe sobre a necessidade da empresa. Vemos sempre se alguém tem um parente ou alguma pessoa para indicar. Quando não há alguém por esse meio, vamos ao tradicional anúncio em jornais, e hoje em dia, em sites de anúncios de emprego sempre colocando nossos diferenciais, que são os nossos benefícios”, destaca Nelson.

Mais adiante, conclui: “O restaurante incentiva o primeiro emprego através da indicação de seus próprios colaboradores, que devido ao excelente ambiente proporcionado pela empresa, trazem seus irmãos, primos ou sobrinhos que ainda não trabalharam. “Sugerimos a estes candidatos, que busquem começar sua vida profissional em funções mais simples, para adquirir certa experiência profissional, e ter a chance de mostrar seu valor e seu potencial para, em seguida, aspirar a cargos de maior desafio.

Após a indicação, o candidato submete-se a uma ficha de solicitação de emprego, em que é avaliado se o candidato possui uma segunda aptidão, quais os seus critérios sobre o que seja uma boa empresa, como se constrói um bom ambiente de trabalho, quais fatores o levarão ao sucesso, se o candidato já conhecia a empresa e, finalmente, qual sonho o candidato propõe-se a realizar.

As entrevistas são realizadas em duas etapas, a primeira pelo preenchimento da solicitação e avaliação da gerência. A partir daí procuram-se levantar as informações fornecidas pelo candidato através de ligações telefônicas para trabalhos anteriores. Após essa etapa é feita uma entrevista pelos proprietários da casa, uma vez aprovado no exame médico, o candidato recebe em seu primeiro dia um código de conduta para que conheça as regras de boa convivência com todos.

Programa de integração (ambientação) de novos empregados

Após receber o código de conduta, o novo colaborador é levado pela gerência a conhecer as instalações e ser apresentado a toda a equipe. Segundo Nelson, o procedimento ocorre da seguinte forma: “Designamos um colaborador mais antigo, de preferência da mesma área, para que seja seu “padrinho”, procurando ajudá-lo a se entregar o mais rápido possível. Também para algumas áreas é ministrado treinamento semanal”.

Além da atividade básica para a qual o empregado é contratado, estimula-se um programa chamado “segunda aptidão”, na qual se aprende algo novo relacionado ao nosso negócio, como fazer brigadeiros, doces e pratos diversos.

Remuneração e benefícios

Na empresa existem diversas formas de reconhecimento, sendo a principal o elogio e o agradecimento verbal, que de acordo com pesquisa interna foi eleito o item mais importante. É oferecida premiação em dinheiro para elogios vindos dos clientes e da gerência sempre que algum colaborador é destacado (R$ 50,00). Também premiamos as equipes de venda por produtividade (R$ 200,00) e Copa/Cozinha por economia nas utilidades (luz, gás e água) bem como premiamos os campeões de conformidades exigidas pela ANVISA (R$ 50,00 por pessoa), eleição e premiação dos funcionários do mês (R$ 50,00) e agradecimento com foto e histórico em nosso Zine mensal, distribuído aos clientes.

A empresa também oferece esporadicamente para seus destaques prêmios como: viagens nacionais e internacionais, computadores, eletroeletrônicos, empréstimos subsidiados, premiação na data do aniversário (R$ 200,00 a 1.000,00), Vale- Fraldas (R$ 100,00) e Vale-Casamento (R$ 500,00). Tal política proporciona uma rotatividade mínima de pessoal.

Qualidade de vida

A empresa, preocupada com a saúde de sua equipe, oferece uma alimentação saudável e balanceada. Os funcionários usufruem do mesmo cardápio oferecido aos clientes e contam com o apoio de nossa nutricionista para orientá-los em suas refeições.

Anualmente, os colaboradores tomam vacinas antigripais e recebem gratuitamente remédios. O próprio plano de saúde oferecido tem aspecto preventivo, pois permite ao médico solicitar exames periódicos para monitorar e prevenir doenças comuns e de fácil controle.

Há um incentivo à prática de esportes por meio de patrocínio do time de futebol de nosso restaurante que é formado principalmente pela equipe do salão e da cozinha. O time participa de vários campeonatos envolvendo outros restaurantes.

Para promover o bem-estar físico e emocional da equipe, há uma verba para incentivo cultural (teatro, cinema, museus, esportes, passeios turísticos), observando que a programação é feita pela própria equipe. É oferecido um programa de inclusão digital (oferecem computadores aos que ainda não possuem).

A empresa também já ofereceu cursos de culinária saudável para quem queria aprender a fazer um prato balanceado, através da escolha por quantidade e alimentos certos, de acordo com as necessidades de cada um. A perda natural do peso e o ganho da consciência nutricional foram alguns dos objetivos do curso, que tinham aulas teóricas e práticas.

Comunicação interna

Para inovar na gestão do restaurante e conquistar a fidelidade de seus clientes, o Fellini compartilha a gestão com seus 62 funcionários. Para isso foi criado um comitê que discute em reuniões quinzenais tudo o que acontece no restaurante. Os integrantes do comitê opinam sobre contratações e podem sugerir que alguém seja mandado embora por alguma falha grave. Por se tratar de uma empresa familiar, na qual os donos participam diariamente da gestão, a comunicação se torna mais fácil.

Também é utilizado um livro de Avisos e Ocorrências diárias em que todos participam com sugestões e recomendações. Além disso, há um quadro de avisos no qual todos podem ler comunicações relevantes.

Relacionamento com sindicato e terceiros

O restaurante possui um bom relacionamento com o sindicato da categoria. Através do mesmo conseguem cursos de especialização que mantêm atualizados os nossos colaboradores, além de termos completa assessoria jurídica, administrativa e fiscal, essenciais para o ramo de alimentação.

Comportamento frente a demissões

A empresa só demite o funcionário que tiver faltas seguidas não justificadas, baixa produtividade em suas funções ou fatos que desabonem sua conduta com outros colaboradores ou clientes. E indica ex-funcionários para o banco de empregos do sindicato, procurando ajudar ao máximo o retorno desse funcionário ao mercado de trabalho.

Mantém os benefícios aos funcionários demitidos durante o mês de sua demissão, para que o mesmo possa terminar seu tratamento dentário ou exames médicos que esteja fazendo. O funcionário, ao ser desligado, fica ciente dos motivos que levaram a empresa a tomar tal decisão: são esclarecidos os pontos fortes e fracos desse funcionário para que o mesmo possa corrigi-los em empregos posteriores.

Há casos de ex-funcionários que foram readmitidos, levando-se em conta o seu desempenho na empresa durante o período que nela trabalhou.

Ações de responsabilidade social

A empresa apoia há mais de 10 anos uma minicreche no Vidigal com 57 crianças e um asilo com 48 pessoas idosas no Jardim Botânico. Os recursos disponibilizados pela empresa são utilizados para a reforma dos prédios, para a compra de mantimentos, agasalhos, utensílios e todas as atividades que envolvam melhorias.

Com o apoio do restaurante, 57 crianças têm uma alimentação saudável, que muitas vezes não têm em casa e a oportunidade de ficar em um lugar agradável e com recursos, levando em conta que seus pais precisam trabalhar e não têm com quem deixar seus filhos. Quanto ao asilo, tornam a vida de 48 idosos mais agradável, pois muitos foram abandonados pela própria família, ficam recompensados em saber que através de ajuda da empresa podem contar com o carinho das pessoas que tomam conta deles.

Breve entrevista

Separamos três questões e suas respostas obtidas em uma entrevista com o gestor do restaurante que ilustram bem a filosofia e atividades de interesse para pequenos e médios empresários que lidam diariamente com dilemas na área de gestão de pessoas. Julgamos ser do interesse de estudantes e empresários a transcrição na íntegra:

Pergunta 1:
Como você vê no caso da Fellini a relação entre comprometimento dos funcionários e satisfação dos clientes?

Essa relação talvez tenha sido a maior “descoberta” ou a maior lição que aprendi nesse processo gradual de crescimento que tivemos. Quanto mais eu “agradava” e cuidava do meu primeiro cliente, o interno, mais percebia a satisfação e fidelização da clientela. Só é possível ter excelência em atendimento com uma equipe comprometida, que por sua vez irá satisfazer os clientes que irão retornar e manter a empresa sadia, o famoso “win, win, win”: a empresa valoriza o colaborador, o colaborador irá prestar excelente serviço ao cliente, que retornará e continuará a fazer negócios com a empresa.

Pergunta 2:
Qual o perfil do funcionário ideal para trabalhar frente a frente com o cliente em sua opinião?

Primeiro gostar de lidar com o público, gostar e entender o trabalho em equipe e principalmente ter a noção da importância da excelência no atendimento, pois atendimento hoje é tão ou mais importante que o produto ou o serviço em si (…) às vezes um sorriso, um “bom dia”, “como vai o senhor ou a senhora?”, ou um “muito obrigado” sincero valem ouro, isso é o que mais me impressiona, como as pessoas nos exigem tão pouco! Só coisas básicas praticamente, algo que já deveríamos trazer na nossa educação e que se torna fácil de se ensinar à equipe.

Pergunta 3:
Que dicas você daria para um pequeno ou microempresário na hora de contratar funcionários?

Primeiro, sempre tomar referência nos trabalhos anteriores, avaliar dependendo do segmento, se é melhor contratar alguém com ou sem experiência. Desde que seja uma empresa que perceba a importância do treino diário das práticas e funções, costumo repetir uma frase que eu criei: “Você só se torna um profissional na área de alimentação no dia em que você entender que terá de repetir todos os dias as mesmas coisas importantes no trabalho”, ou seja, no treino diário.

Acho importante usar a sensibilidade para ver se o candidato tem o “perfil” que se encaixa na equipe. Não contratar quem não fica em um emprego, aquele tipo que passa só alguns meses e sai. Verificar detalhadamente a carteira de trabalho. Dar preferência a quem more perto. Perguntar sobre uma segunda aptidão.

No Fellini, um dos meus garçons faz pastel antes de começar o movimento, a menina da balança faz brigadeiros e há vários outros com os quais desenvolvemos uma segunda aptidão. Certa vez, tivemos a ausência de um cozinheiro. Minha equipe deu conta do recado justamente pelo desenvolvimento dessa segunda aptidão e de comprometimento com a casa.

Considerações finais

O diferencial do Restaurante Fellini dá-se em função da sua gestão em busca da excelência de produtos e processos, ressaltando que nesse segmento e para o porte do restaurante essas práticas são inéditas. Fellini é uma empresa que alcança o paradigma da administração “win, win, win”, vence o cliente, que tem uma excelente relação custo-beneficio, vence o colaborador que trabalha motivado e comprometido e vence a empresa que se mantém profícua através dos anos, ou seja, uma operação em que todos são vencedores.

Os treinamentos, voltados para as equipes, priorizam pontos como gestão da fala, linguagem corporal, desenvoltura e articulação das palavras, capacidade de improvisação diante de situações inusitadas, capacidade de liderança e de trabalho em equipe. Estimulam-se esses pontos para se ter uma equipe espontânea: os clientes têm que se sentir em casa e ter uma relação amigável com a equipe. “Assim conseguimos clientes fiéis”, destaca Nelson. “É preciso saber lidar com a necessidade de cada cliente para manter a imagem da empresa”, conclui.

Ao que podemos constatar, grandes ideias de gestão podem e devem ser valorizadas em empresas de qualquer porte.

Desafio

Nelson olha para o seu restaurante, conversa com seus funcionários e cumprimenta clientes. Embora feliz com o restaurante e o reconhecimento da mídia, precisa de ajuda para perpetuar e sempre reinventar seu negócio. Muitos questionamentos ocorrem: como perpetuar os valores do restaurante, mesmo quando ele não estiver à frente do negócio? que outras políticas de RH seriam bem-sucedidas no restaurante e trariam mais satisfação aos clientes internos e externos? que mudanças devem ser feitas agora antes que elas sejam urgentes?

Você agora é um consultor contratado por Nelson e sua família. Ajude-o a sanar tais dúvidas. Elabore um plano de Recursos Humanos, abordando temas como:

  • A relação entre cultura organizacional e valores dos sócios gestores. Qual o impacto de tais valores e cultura no perfil do colaborador a ser contratado? Aborde em sua recomendação aspectos técnicos e comportamentais desejados.
  • Um restaurante como o Fellini é construído com o olhar atento e disciplinado dos seus donos. Pelo perfil familiar da empresa, como você vê a continuidade desta excelência na ausência dos principais sócios? Elabore um processo de continuidade da excelência na ausência de tais sócios.
  • A cadeia serviços-lucro sendo posta em ação no restaurante.

Fonte: Central de Cases da ESPM

Nota do Autor:
Preparado pelo Prof. Rodrigo Siqueira, da ESPM-RJ, em parceria com a Associação Brasileira de Recursos Humanos (ABRH-RJ). Disciplinas a que se aplica: Gestão de Pessoas, Marketing de Serviços, Endomarketing. Este caso foi escrito inteiramente a partir de informações cedidas pela empresa e outras fontes mencionadas no tópico “Referências”. Não é intenção do autor avaliar ou julgar o movimento estratégico da empresa em questão. Este texto é destinado exclusivamente ao estudo e à discussão acadêmica.

Referências:

  • BOHLANDER, George; SNELL, Scot e SHERMAN, Arthur. Administração de RH. Thomson, SP, 2003.
  • BOUDREAU, J E MILKOVICH, G. Administração de RH. Atlas, SP, 2000.
  • DUTRA, Joel – Gestão de Pessoas – Editora Atlas, SP, 2002.
  • RESENDE, Enio – Remuneração e Carreira Baseadas em Competências e Habilidades, Qualimark, RJ, 2002.
  • TANURE, T; EVANS, P E PUCIK, V. A Gestão de Pessoas no Brasil. Editora Campus, RJ, 2007
  • ZEITHAML, V. A.; BITNER, M. J. Marketing de Serviços: a empresa com foco no cliente, 2 edição, Porto Alegre: Bookman, 2003.