Como aumentar a empregabilidade dos jovens

Empresas como CVS, American Express e SK Group estão obtendo bons resultados com abordagens inovadoras para reverter a epidemia de desemprego jovem – que é algo ruim para todos.

Esta não é uma boa época para ser jovem no mercado de trabalho. A taxa de desemprego mundial nesse extrato da população voltou a crescer em 2016: o percentual de jovens entre 15 e 24 anos de idade sem ocupação alcançou 13,1%, de acordo com relatório da Organização Internacional do Trabalho (OIT).

Tanto nos países em desenvolvimento como nos mais ricos, os governos buscam reduzir o desemprego juvenil e aumentar a inserção dos jovens no mercado de trabalho, de maneira sustentável. Essa, porém, também deve ser uma preocupação das empresas, que, cada vez mais, encontram dificuldades para preencher certos tipos de vagas. O descompasso entre demanda e oferta deve permanecer por algum tempo.

O Bureau of Labour Statistics dos Estados Unidos projeta que até 2022 serão criados cerca de 6 milhões de vagas destinadas a quem está ingressando no mercado de trabalho, com pouca formação e quase nenhuma experiência, em diversos setores de atividade. E as empresas que não conseguirem preencher essas posições enfrentarão problemas de produtividade e faturamento. Ao mesmo tempo, cerca de 5,5 milhões de jovens entre 16 e 24 anos já se encontram fora do mercado de trabalho e fora da escola [o que, no Brasil, os especialistas costumam chamar de “geração nem-nem”]. Isso significa um contingente expressivo e inexplorado de talentos [além de combustível para a violência social].

A solução para reverter isso é preparar esses jovens para conquistar o primeiro emprego e se inserir com sucesso no mercado de trabalho, o que demanda abordagens inovadoras com colaboração entre empresas, ONGs e governos. Segundo estudo recente da Bridgespan, três caminhos têm se destacado nessas abordagens.

FOCO EM HABILIDADES E APTIDÕES

As equipes de recursos humanos das empresas devem começar por avaliar as competências que os jovens podem oferecer. Em vez de fazerem a triagem dos candidatos excluindo aqueles que não possuem diplomas e experiência, essa abordagem opta por incluí-los com base em habilidades e aptidões.

Um estudo realizado pela Innovate + Educate comprova como essa abordagem aumenta o número de candidatos qualificados. A pesquisa concluiu que, enquanto apenas 1% dos jovens adultos desempregados atende aos critérios para contratação tradicionais para quem tem graduação, 33% superam esses obstáculos quando avaliados por habilidades e aptidões.

A rede de farmácias CVS, norte-americana, adotou essa abordagem como parte de seu processo de recrutamento e seleção voltado aos candidatos em busca do primeiro emprego. A companhia contrata cerca de mil pessoas com esse perfil por semana para “abastecer” suas 9,6 mil lojas de varejo com caixas, funcionários que atuem na organização das prateleiras e técnicos farmacêuticos. O programa de aprendizes da CVS foi construído para treinar e reter jovens profissionais.

Os esforços da rede incluem uma “loja-escola” em um colégio técnico no estado de Massachusetts, em que 75% dos estudantes são de baixa renda. Quem se destaca recebe oferta de emprego, para trabalhar em loja em tempo parcial e, após a formatura, em tempo integral (se quiser). Quem desejar se tornar farmacêutico ou buscar carreira na área administrativa pode seguir em tempo parcial a fim de conciliar trabalho e estudos.

Os gestores avaliam os jovens candidatos concentrando-se em descobrir se possuem habilidades para lidar com os clientes.

ORIENTAÇÃO DURANTE O TRABALHO

Muitas profissões modernas, do eletricista ao médico, ainda desenvolvem talentos promovendo o encontro entre jovens inexperientes e mentores experientes. Esse tipo de aprendizado no próprio trabalho oferece algo que as pesquisas mostram ser muito eficaz: a possibilidade de experimentar. Por isso mesmo, recomenda-se que 70% do processo de treinamento ocorra durante o trabalho. Assim, não surpreende que empresas bem-sucedidas na contratação de jovens são também comprometidas com o mentoring.

Uma delas é o SK Food Group, empresa norte-americana do setor de alimentos com vendas anuais de US$ 300 milhões. Fornecedora de redes de cafés e varejistas, a SK inaugurou em 2014 uma planta para a produção de sanduíches que se tornou também um projeto-piloto para a LeadersUp, uma espécie de agência de empregos para jovens fundada com o apoio da Starbucks.

A SK precisava de centenas de funcionários para essa nova instalação, mas enfrentava dificuldades de contratação no mercado de trabalho local. A LeadersUp convenceu a empresa de que havia um contingente de talentos jovens que poderia resolver o problema. A exemplo da CVS, a SK passou a selecionar jovens candidatos com base em competências e, no final das contas, contratou 220 jovens para a fábrica.

O grupo pediu que seus gestores acompanhassem de perto esses jovens funcionários e buscassem identificar “momentos de aprendizado”. Tanto os colaboradores como as lideranças testemunham que esse tipo de apoio informal e cotidiano pesa muito na evolução dos jovens.

O treinamento oferecido pela SK também inclui aspectos básicos do comportamento no ambiente de trabalho, como comunicar-se de maneira clara e chegar no horário. Os gestores devem reconhecer que os jovens funcionários estão sujeitos a imprevistos, como problemas no transporte ou dificuldade em conseguir quem cuide de seus filhos (muitos já são pais). No entanto, quem deixa de avisar o supervisor que não conseguirá chegar sofre consequências, que podem ir da advertência à demissão.

EMPATIA, RESPONSABILIZAÇÃO E GRUPOS DE PARES

A alta rotatividade entre jovens no primeiro emprego, que, segundo alguns estudos, pode chegar a 70%, é uma das grandes preocupações das empresas. Quando se trata de trabalhadores com nível de renda menor, observa-se que 75% enfrentam desafios pessoais que podem prejudicar significativamente o desempenho no trabalho ao longo de um ano. As organizações que analisamos encontraram formas de garantir o engajamento também entre esses jovens funcionários, desde o primeiro dia de trabalho.

As empresas mais bem-sucedidas nesse campo criaram uma “cultura de desenvolvimento de carreira” que oferece uma mistura de responsabilização e empatia, reduzindo as barreiras ao sucesso profissional. No grupo SK, por exemplo, disponibiliza-se tempo de folga para que os funcionários resolvam questões pessoais e há a possibilidade de mudanças de turno para aqueles que têm dificuldade em ter com quem deixar as crianças pela manhã.

Os jovens colaboradores também contam com o apoio e a orientação de seus pares. A atuação da LeadersUp possibilitou criar grupos de novos contratados que estabeleceram vínculos e aprenderam juntos. A empresa descobriu que jovens em grupo tendem a apoiar e motivar uns aos outros ante os desafios, o que ocorre com menos frequência quando são tratados individualmente.

A SK também faz parcerias com empresas locais para lidar com as dificuldades de logística enfrentadas pelos jovens funcionários. Conseguiu, com isso, oferecer um serviço de ônibus melhor e aumentar a disponibilidade de creches.

Dos 220 jovens contratados em 2014, 80 ainda estão no grupo, o que representa uma taxa de retenção 23% superior à de outros processos de recrutamento da SK. Mais de 20 desses colaboradores já foram promovidos.

ALÉM DA RSE

Muitas organizações tendem a encarar a contratação de jovens como ação de responsabilidade social empresarial (RSE). Algumas, porém, avançam no sentido de adotar essa abordagem de maneira estratégica para alcançar o sucesso. O estudo mostra que, para dar esse passo adiante, as organizações precisam de pessoal dedicado ao tema e lideranças comprometidas em aprimorar constantemente os processos de recrutamento, orientação e desenvolvimento dos jovens em primeiro emprego.

Na American Express, por exemplo, o apoio veio da alta direção, e a empresa começou a contratar jovens em 2007, por meio do programa da norte-americana Year Up, que tem como missão eliminar o abismo entre jovens de talento em busca de oportunidades e empresas que querem contratar.

O presidente da American Express, Ken Chenault, afirmou que o programa era uma relação ganha-ganha entre a companhia e as comunidades atendidas. Mas foi Destin Dexter, vice-presidente de tecnologia da Amex, que ampliou os esforços para alcançar os objetivos corporativos de contratação de jovens talentos na área de tecnologia da informação, um segmento ultracompetitivo do mercado de trabalho.

Com uma trajetória de mais de 165 anos, a American Express é uma típica instituição financeira, não exatamente o tipo de lugar repleto de jovens graduados em ciências da computação. Como, então, atrair jovens em busca do primeiro emprego?

Após o sucesso do projeto-piloto, Dexter ampliou a iniciativa com um programa de oito anos para o qual selecionava os candidatos com base na familiaridade deles com a lógica e os números. “Os jovens vinham trabalhar com um sorriso no rosto e com atitude e disposição para aprender”, relata o executivo.

Hoje, a empresa conta com 80 a 100 estagiários da Year Up anualmente na área de tecnologia. Esse grupo apresenta uma taxa de 72% de conversão para o tempo integral, ante cerca de 60% dos processos tradicionais de contratação de jovens. Esses candidatos também permanecem mais tempo: 44 meses, mais do que o dobro dos 18 meses dos processos tradicionais.

O ESFORÇO COMPENSA

Os investimentos em jovens que buscam o primeiro emprego, mesmo com formação e experiência limitadas, tendem a gerar funcionários fiéis, entusiasmados e capacitados que querem permanecer na empresa. Além de reduzir significativamente a rotatividade, ele compensa pela criação de um fluxo interno de talentos que alimentará as promoções futuras, como vemos acontecer na CVS e na American Express.

À medida que as empresas procuram formas de preencher as vagas de primeiro emprego que devem surgir nos próximos cinco anos – cerca de 6 milhões só nos Estados Unidos –, os jovens com perfil de pouca formação e pouca experiência surgem como uma oportunidade de solução.

E as lições aprendidas por essas organizações mostram como é possível reduzir o desemprego desse extrato da população, em qualquer lugar do mundo, quando o setor privado, as ONGs e os governos trabalham juntos.

É preciso enxergar o jovem como um investimento

A contratação de jovens costuma ser encarada como ação de responsabilidade social por muitas empresas – em relação às comunidades em que estão localizadas. As organizações bem-sucedidas estudadas pelos autores são diferentes: enxergam essas iniciativas como bons investimentos. Embora haja custos iniciais que precisam ser levados em conta, creem que os benefícios compensam.

BENEFÍCIOS

  • Aumento da retenção de funcionários.
  • Melhoria do desempenho dos colaboradores.
  • Redução dos custos de contratação e treinamento decorrente da maior qualidade das parcerias de recrutamento.

CUSTOS

  • Tempo dos profissionais da empresa gasto na coordenação de programas pró-jovens e na orientação deles.
  • Salários (por baixa produtividade).
  • Pagamento a organizações parceiras.

Os custos podem ser reduzidos, como mostra um caso do setor varejista dos EUA, no qual a substituição de um funcionário médio custa cerca de US$ 3,4 mil e a rotatividade é de 60% ao ano em média. No caso de uma empresa com 5 mil jovens, o custo anual da rotatividade pode ser de pouco mais de US$ 10 milhões, mas o turnover pode cair pela metade se houver investimento de US$ 5 mil em treinamento por jovem. E aí haverá economia de US$ 2,5 milhões por ano.

 

Fonte: Revista HSM Managent e Bridgespan Group, publicado originalmente na revista Rotman Management por: Willa Seldon, Katie Smith Milway, Simon Morfit e Brian Bills. O Bridgespan Group é uma empresa de consultoria sem fins lucrativos especializada em investimentos e ações de responsabilidade social.


O desafio da empregabilidade de jovens no Brasil

De acordo com a 62ª edição do boletim Mercado de trabalho, publicado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), o maior contingente de desempregados no Brasil de 2016 eram os jovens. Entre as pessoas de até 24 anos de idade, as taxas de desemprego trimestrais ficaram em 27,2% na média, ante 13,1% na população mundial. Isso sinaliza uma mudança do mercado de trabalho que vai além da influência da crise econômica. O rápido avanço da tecnologia tem levado ao surgimento de negócios que exigem novos profissionais – e os jovens aparentemente não estão conseguindo atender ao que é demandado.

O fato é que estamos ingressando no futuro do trabalho. Em 2016, a área de inovação da Cia de Talentos, empresa do Grupo DMRH, realizou um profundo estudo para identificar as principais tendências nesse campo e, entre elas, destacou-se a inclinação das empresas a recrutar pessoas colocando menos foco no diploma e mais em habilidades – leia-se “competências comportamentais” – e em, digamos, experimentação da vida.

Como um jovem pode ter essas habilidades e experimentos? Por meio da educação. Se quiser cuidar de seus jovens, o Brasil tem de lhes proporcionar uma educação mais próxima da prática e mais orientada à aquisição de habilidades. A transformação da universidade é o movimento fundamental para isso acontecer: a academia deve mostrar a realidade aos alunos e oferecer-lhes vivências.

No Grupo DMRH, temos um projeto denominado “Jornada para o Futuro”, que atende a essa demanda. A proposta é, desde o primeiro semestre dos cursos de graduação, aproximar estudantes, professores e faculdades das empresas e de seus líderes. Isso permitirá aos universitários experimentar possibilidades e também lhes dará insights, provocações e o autoconhecimento necessário para que desenvolvam suas habilidades. Assim eles conseguirão tomar decisões de carreira conscientes, alinhadas com seus valores e objetivos de vida. Esse é, a nosso ver, o melhor (ou único) modo de reverter a dificuldade, cada vez maior, de nossos jovens se inserirem no mercado de trabalho.


Fonte: Revista HSM Management, por Adriana Chaves, sócia-diretora responsável pela divisão de desenvolvimento e carreira do Grupo DMRH, e Danilca Galdini, diretora da Nextview People, também do Grupo DMRH.