Logística orientada para o cliente

Todos os elos da cadeia de suprimentos e produção podem trabalhar para o cliente e tornar-se fonte de vantagens estratégicas se ela for projetada de forma inovadora.

A maioria das empresas vê a logística apenas como uma maneira de reduzir custos, e isso é uma realidade no mundo inteiro. Algumas, contudo, começam a utilizar o sistema de distribuição como fonte de vantagem competitiva.

Conseguem isso personalizando o pacote de serviços oferecido, a fim de atender às necessidades específicas de cada grupo de clientes. Para tanto, tratam de encontrar novas formas de organizar a cadeia de suprimentos e de alinhar seus integrantes à estratégia global.

Os autores deste artigo, consultores da Mercer Management Consulting, explicam como pode ser implementada a Logística Orientada para o Cliente. Utilizando exemplos concretos, como o da Dell Computer, expõem seu processo, de quatro etapas: compreender as necessidades dos clientes, identificar seu estágio de vida, desenvolver pacotes de serviços com foco nos clientes e alinhar toda a cadeia de suprimentos à estratégia da empresa.

A capacidade de gerar altos lucros costuma ser resultado direto da eficácia da cadeia de suprimentos. Uma cadeia de suprimentos bem projetada é personalizada para atender às diversas necessidades dos vários grupos de clientes, permitindo que se encontre o equilíbrio entre geração de receita e custo do serviço.

Apesar disso, muitos dos projetos de cadeias de suprimentos atuais não atendem às necessidades dos clientes de alto valor para a empresa. Um dos motivos dessa falha é o aumento da complexidade. A diferenciação de produtos vem sendo vista há muito tempo como um caminho para a satisfação do cliente e o crescimento lucrativo.

Nos últimos anos, porém, tem havido uma explosão na variedade de produtos oferecidos aos clientes –seja a variedade de cores, de estilos, seja a de funcionalidade. Surgiu também um aumento significativo no número de canais para servir aos clientes. O resultado é um aumento da complexidade e do custo da cadeia de suprimentos. Isso torna um desafio ainda maior a atribuição do valor correto ao cliente certo pelo preço adequado.

A complexidade é um dos motivos pelos quais os gerentes não conseguem realmente adaptar as cadeias de suprimentos para atender às várias necessidades dos clientes. Mas a maneira de os executivos pensarem quanto à cadeia de suprimentos é, também, uma barreira ao progresso:

  • Perspectiva. A logística é vista, geralmente, como um centro de custos e não como um processo impulsionado pelo cliente.
  • Papel. O projeto dos serviços não é considerado tão crucial quanto o projeto do produto. Embora sejam feitas pesquisas iniciais de mercado, estas são, em geral, centradas nas características do produto e não estão ligadas aos processos e serviços da cadeia de suprimentos.
  • Organização. Apesar de ter sido feito algum progresso nesse sentido, continuam a existir funções que fazem as vezes de silos, impedindo a eficácia da cadeia de suprimentos.
  • Medição. O sucesso da logística é medido, primeiramente, em função dos orçamentos. O serviço ao consumidor é acompanhado apenas em níveis básicos, tais como média de disponibilidade de produtos e média de tempo de produção.

Logística com foco no cliente

As empresas que adotam as melhores práticas vão além das formas tradicionais de pensar e aprendem a usar a cadeia de suprimentos como uma ferramenta poderosa para dar aos clientes mais valor. A Logística Orientada para o Cliente permite conquistar vantagens competitivas, concentrando o foco cuidadosamente na proposta logística de valor e cultivando relacionamentos lucrativos com o cliente.

Trata-se de um método de usar a logística para ir além da diferenciação de produtos, chegando à diferenciação de serviços.

Estudo de caso: Dell Computer

A Dell representa um exemplo claro de como a abordagem centrada no serviço pode produzir vantagens mercadológicas significativas. A Dell logo reconheceu que o canal de distribuição multiescalonado típico não era eficaz para atender às necessidades de serviço de um grande segmento de mercado de microcomputadores –aquele de usuários finais tecnicamente sofisticados. Ao contrário de outros usuários, as pessoas deste segmento não estão interessadas em informações e instruções que costumam servir de base para a compra. Em vez disso, esses clientes querem microcomputadores configurados para atender a suas necessidades específicas com rapidez e o melhor custo–benefício.

Tal pacote de serviços é bem diferente do que se vê comumente nos canais de revenda convencionais. Mudanças rápidas de tecnologia, de preço e de exigências dos clientes tornam difícil a abordagem tradicional do tipo “produzir–transportar– vender” pelos revendedores, com pouca capacidade de resposta e onerosa para o segmento do usuário final. A abordagem de serviço centrada no cliente incorpora três elementos estratégicos.

  • Em primeiro lugar, concentra-se nos clientes tecnicamente sofisticados, que oferecem grandes margens de lucro. A Dell reconhece que esses clientes não só compram produtos de maior valor, como também exigem menos assistência técnica e informações.
  • Em segundo lugar, a Dell entende profundamente as necessidades desses clientes do ponto de vista logístico e elaborou uma cadeia de suprimentos feita sob medida, totalmente concebida para atender a essas necessidades.
  • Em terceiro lugar, a Dell introduziu o modelo de vendas e entregas que não usa varejistas. O resultado é uma cadeia de suprimentos que permite a entrega rápida e direta de máquinas criadas especialmente para os clientes, a um preço muito baixo. Recentemente, a Dell colocou com sucesso esse modelo de vendas diretas no canal da Internet.

Em razão do baixo custo de estoque e entrega, da diminuição do ciclo do produto, dos relacionamentos diretos com o cliente e do uso da estratégia de Logística Orientada para o Cliente, a Dell conseguiu um crescimento rápido e um valor significativo para o acionista.

Um programa de quatro etapas

Como outras empresas conseguem atingir certas inovações na cadeia de suprimentos capazes de destruir paradigmas? A Mercer desenvolveu uma estrutura comprovada que pode ajudar os gerentes a desenvolver uma logística voltada para o cliente em uma série de situações e setores competitivos. Trata-se de uma abordagem de quatro etapas, que começa pelo cliente.

Etapa 1: Compreender as necessidades dos clientes.
Muitos métodos podem ser usados para compreender as necessidades de serviço do cliente. Esses métodos vão desde técnicas simples –como levantamentos para explicar os requisitos mais óbvios e mais facilmente explicáveis– até métodos avançados de pesquisa. Entrevistas com participantes de canais, por exemplo, podem ajudar a esclarecer não só os requisitos emergentes ou não-expressos, mas também a enfatizar os objetivos que não se adequam.

Podem ser usadas técnicas quantitativas mais sofisticadas quando o número de atributos de serviço considerados é relativamente pequeno. O uso desses métodos torna possível obter uma boa compreensão da necessidade dos clientes e estimar as possíveis respostas a novas ofertas.

Etapa 2: Compreender a fase do ciclo de vida dos clientes.
A compreensão da diferença de valor de cada cliente é crucial para a Logística Orientada para o Cliente. Com quais clientes temos hoje um relacionamento lucrativo? Quem serão os clientes lucrativos de amanhã? Ou, por outro lado, quais clientes valorizam pouco nossos produtos e serviços?

Muitas vezes o sistema de logística fica separado da compreensão da lucratividade do cliente. Porém, como mostra a experiência da Dell, essa ligação é crucial. Poucas empresas se dão ao luxo de escolher seus clientes a dedo. Na verdade, a maior parte das grandes empresas tem de proteger seus principais clientes contra concorrentes novos e ágeis. Isso faz com que seja ainda mais importante saber quem é quem. Simples técnicas de avaliação usando dados de custo de serviço e receita podem ajudar a obter uma estimativa da lucratividade atual.

Algumas empresas, contudo, levaram esse raciocínio um pouco adiante. Elas estimam o ciclo de vida esperado de cada cliente, identificando as futuras correntes de lucros potenciais com o emprego de métodos como determinação de custo baseado na atividade (ABC ou Activity Based Costing) e na previsão de lucros de longo prazo.

Etapa 3: Desenvolver pacotes de serviço voltados para os clientes.
Uma vez compreendidas as necessidades de cada cliente e seu potencial de lucro, podemos determinar qual o pacote e o nível dos serviços que lhe devem ser oferecidos. Em primeiro lugar, é preciso segmentar os clientes em quatro grupos amplos, classificados de acordo com sua expectativa de valor fornecido ao longo do tempo e a singularidade de suas necessidades de logística (veja quadro na página seguinte).

O passo seguinte consiste em colocar os clientes em todos os quadrantes e continuar a segmentálos de acordo com suas necessidades específicas. Por exemplo, no quadrante “alto valor, necessidades logísticas diferenciadas” pode ser necessário classificar os clientes em três subgrupos, de acordo com suas expectativas de tempo de entrega, tipo de embalagem e taxas de preenchimento de pedidos de compra.

Podemos então finalizar a oferta específica de serviço para cada um dos grupos, que deve basear-se no equilíbrio entre o valor do cliente e o custo de servi-lo. O resultado da etapa 3 é um conjunto muito claro de parâmetros de serviço, atrelado a grupos específicos de clientes.

Etapa 4: Alinhar toda a cadeia de suprimentos à estratégia.
Definidos os requisitos de serviço do cliente, temos de desenvolver uma cadeia de suprimentos adequada, capaz de cumprir nossas promessas. Para que haja sucesso, é preciso coordenar o desempenho de cada uma das etapas da cadeia de suprimentos, desde o projeto, a provisão e a fabricação até vendas e distribuição, para que os pacotes de serviço corretos sejam implementados dia após dia.

Ao projetar o modelo da cadeia de suprimentos, é preciso pensar não só na infra-estrutura e nos recursos físicos, mas também nos recursos humanos, nas medidas de desempenho e nos sistemas de informação. Embora esse possa ser um grande desafio, se a abordagem de Logística Orientada para o Cliente tiver sido adotada, a empresa será orientada por uma idéia bastante clara sobre o que a cadeia de suprimentos deve realizar.

Estratégia de ação

Como implementar essas quatro etapas no mundo real?
Recentemente, a Consultoria Mercer assessorou uma grande fabricante de produtos de consumo na implantação da abordagem de Logística Orientada para o Cliente como base para a otimização de sua rede de distribuição. A empresa tem 200 clientes principais e um extenso cadastro de clientes menores. Uma análise ampla da lucratividade e do valor dos clientes mostrou que alguns deles tinham realmente mais valor, isto é, davam mostras de que cresceriam mais rapidamente e gerariam margens líquidas maiores.

A questão, portanto, era como construir um sistema de distribuição flexível e capaz de centralizar a atenção nesses clientes de maior valor sem deixar de servir aos outros clientes com uma boa relação custo–benefício.

Para garantir a completa compreensão das necessidades logísticas dos clientes, a empresa identificou nove parâmetros críticos de serviço. Em seguida, agrupou os clientes de acordo com as semelhanças de suas necessidades, dentro dessas dimensões –a começar pelos clientes de maior valor. Em seguida, foram projetados diversos pacotes de serviço, que definiam a maneira como a empresa serviria aos grupos de clientes. Para alguns, o aspecto central era a satisfação de necessidades específicas de clientes de alto valor, enquanto outros pacotes ofereceriam serviços mais básicos, dirigidos a outros clientes.

A definição dos requisitos de logística permitiu à empresa encontrar logo de início a melhor configuração para seu sistema de distribuição. Resultou também em fluxogramas adequados ao realizar os serviços a custos mínimos.

A abordagem personalizada de pacotes de serviço oferece uma vantagem competitiva maior que os serviços do tipo “tamanho único” e proporciona uma flexibilidade que permite a rápida adaptação às mudanças de necessidades do cliente. Além de gerar vantagens competitivas para empresas industriais, a capacidade de contar com uma distribuição específica para o cliente mostra-se um fator de sucesso essencial para os prestadores de serviço.

Por exemplo, algumas prestadoras de serviço voltadas para a logística têm formado alianças de valor agregado com clientes da indústria automobilística, concentrando- se em programas adaptados para a entrega de peças de reposição pelo sistema just-in-time a baixo custo. Com isso, as montadoras- clientes obtêm não só economia de custos, como também serviços diferenciados que atendem a necessidades específicas. Os fornecedores de serviços logísticos capazes de satisfazer tais necessidades crescem solidamente e se internacionalizam cada vez mais.

Resultado de sucesso

A logística voltada para o cliente é um elemento-chave do sucesso dos negócios –embora muitas vezes relegada a segundo plano–, o que o eleva ao nível estratégico, ao lado da prestação de serviços. A logística transforma aspectos fundamentais da concorrência, como preço e características do produto, em excelência de serviço e valor para o cliente.

Sistemas logísticos flexíveis e dinâmicos, que se concentram nos requisitos dos clientes, podem proporcionar às empresas vantagens competitivas tanto sobre concorrentes estabelecidos como sobre novos participantes do mercado. Principalmente nas indústrias em que a diferenciação de produtos é cara ou arriscada, ou atingiu o ponto dos lucros decrescentes, a abordagem voltada para o cliente e o pensamento inovador sobre a cadeia de suprimentos podem ser o caminho para soluções econômicas específicas para o cliente, que proporcionam, ao mesmo tempo, aumento de mercado.

Conceitos básicos sobre logística
No vídeo abaixo, Flávio Vicente – apresentador do programa Aprendendo a Empreender – entrevista o professor Tarcísio M. Menezes e detalha as principais características da logística e sua importância em empresas de todos os segmentos e tamanhos.

Assista o vídeo O QUE É LOGÍSTICA

Fonte: Youtube e Revista HSM – por Fast Company e distribuído por Tribune Media Services International. Reportagem de David M. Bovet e Sridhar Thiagarajan, para a Mercer Management Consulting e publicada no Brasil pela revista HSM Management.