18 ideias para o sucesso

O que aumenta as probabilidades de sucesso de uma inovação social? Conforme Kriss Deiglmeier, que por muito tempo dirigiu o Centro de Inovação Social da Stanford University, uma das principais referências da área, o que constrói a inovação social é principalmente retroalimentação entre os setores privado, público e o terceiro setor, gerando três mecanismos críticos de inovação social: “a troca de ideias e valores, as mudanças nos papéis e relacionamentos, e a integração do capital privado com o apoio de recursos governamentais e filantrópicos”.

 

Em outras palavras, quando ONGs, empresas e governos atuam juntos, a probabilidade de alcançarem uma solução nova, que beneficie todos na sociedade, para um problema social é muito maior do que quando ficam isolados. Sozinhos, limitam as ideias a seus espaços e o resultado tende a ser ineficaz. Em fevereiro de 2014, a própria Deiglmeier deixou Stanford para ser CEO da Tides, facilitadora dessa retroalimentação.

Segundo ela, as empresas (com fins lucrativos) estão liderando a luta em cada vez mais questões sociais e, com elas, começa-se a estruturar os elementos que aumentam as chances de uma iniciativa de inovação social dar certo, com um conjunto de melhores práticas bem similar ao das companhias que visam o lucro e alguns fatores de sucesso mais específicos.

Melhores práticas e fatores de sucesso

Henrique Bussacos, empreendedor social ligado ao Impact Hub, considera difícil elencar as melhores práticas de um negócio social. Em geral, em sua opinião, “o empreendimento social não é muito diferente de um empreendimento convencional; tudo o que contribui para ter sucesso em um vale para o outro, somado à sensibilidade em relação a questões sociais”. Pode-se dizer, contudo, que há alguns fatores de sucesso que podem ser considerados mais específicos do ramo.

A seguir, fizemos uma lista de melhores práticas e fatores de sucesso do setor 2.5. Contamos com a ajuda de Bussacos, que mantém conexões com um grande grupo de empreendedores sociais; de Fernanda Bornhausen Sá, presidente do Social Good Brasil, evento voltado para a divulgação de tecnologia e conhecimento para a solução de problemas sociais, diretora da Clear Educação e Inovação e fellow do Synergos Institute, de Nova York; e de Carolina de Andrade, gerente para inovação do Instituto Comunitário Grande Florianópolis, onde atua como coordenadora do Centro de Apoio à Inovação Social (Cais), e também gestora do Social Good Brasil.

Priorizar a intersetorialidade.

Não é apenas em Stanford; no Brasil, essa também é a número um entre as melhores práticas de inovação social. Trata-se da capacidade de articular setores diversos e especializados.

Em uma inovação social, a academia pode dar contribuições tão importantes quanto as do setor privado, as do governo e as do terceiro setor. “Isso permite o acesso a expertises diferentes que se complementam para gerar o resultado final ao beneficiário, tornando a iniciativa mais ágil e direta”, diz Bornhausen Sá. Para ela, não basta a interconexão formal; “a equipe tem de estar muito bem afinada”.

Definir os atores primeiro, a solução depois.

Trata- se praticamente da mesma receita do especialista em gestão Jim Collins –“primeiro quem, depois o quê”. Determinar quem serão os principais atores antes de idealizar a solução de como transformar algo tende a facilitar sobremaneira a execução dessa ideia –e seu êxito. Todos participam mais.

Atuar em equipe.

Desprender-se da propriedade intelectual de um projeto mostra-se bem importante, porque uma equipe complementar e parceira é que costuma ser sinônimo de sucesso em inovação social. Em empreendimentos com objetivos socioambientais, o apego autoral é mais comum do que se pensa.

Definir bem o modelo de negócio –com o canvas.

Os melhores projetos de inovação social têm um modelo de negócio cuidadosamente elaborado, esclarecendo qual a proposta de valor, o público-alvo e como vão capturar recursos financeiros, seja com patrocinadores, seja oferecendo serviços para gerar receita. A ferramenta canvas tem sido muito utilizada para isso, como destaca Andrade.

Gerenciar com excelência.

Analisar e tomar decisões que aumentem a eficiência e a eficácia das atividades é um ponto comum dos negócios sociais bem-sucedidos, porque só assim se lida bem com a limitação dos recursos e as urgências das comunidades.

Ter foco.

Os melhores negócios sociais já aprenderam que, quando se perde o foco, o beneficiário potencial sai prejudicado, como lembra Bussacos.

Obter o verdadeiro comprometimento dos gestores.

É crucial que estes tenham, além de amor pela causa, um real compromisso com a geração de um resultado de impacto, como reforça Bussacos. “Isso é o que possibilita contornar as dificuldades que surgirão para quebrar os paradigmas que será necessário quebrar.” O compromisso costuma ser reforçado com a disseminação dos cases dentro da organização. Caso contrário, a iniciativa estará fadada à superficialidade.

Desenvolver a iniciativa como um projeto à parte.

Pode ser uma incubadora ou uma unidade de negócios separada, mas essa é a preferência entre grandes empresas, como observa Bussacos. Requer, contudo, ainda mais comprometimento com a causa.

Alinhar a inovação social com a atividade da empresa privada envolvida.

Isso é desejável não apenas em nome de criar valor compartilhado, como prega Michael Porter, mas, conforme Bussacos, porque permite aproveitar as competências das pessoas que já estão na companhia. “Ir por um caminho diverso é desperdiçar competências e know-how existentes.”

Moldar a cultura da empresa para permitir diálogo com os diversos stakeholders.

O ambiente mais propício para o diálogo, que depende da cultura corporativa, é comum em casos de sucesso de inovação social, segundo Bussacos.

Ter uma área de sustentabilidade convencional já bem estruturada.

Esta costuma puxar as demais áreas organizacionais e a disseminação da inovação social é facilitada.

Adotar a lean startup.

O empreendedorismo enxuto –ou lean startup, em inglês– veste como uma luva na inovação social. “Assim como a lean startup é focada em desenvolvimento de clientes para novos negócios com etapas muito simples, nossas iniciativas precisam inovar com simplicidade com base no desejo do público-alvo”, explica Andrade.

Praticar o design thinking.

O pensamento do design se encaixa perfeitamente à inovação social, conforme Andrade, na medida em que busca soluções de maneira criativa com empatia e colaboração radical.

Focar o beneficiário do projeto.

O foco sempre deve ser no usuário, visando tanto a viabilidade como a usabilidade do projeto por ele, e tem de ser reforçado da concepção da ideia a sua execução.

Fazer intensa experimentação.

“A ordem é experimentar muito. É necessário fazer pequenas apostas, protótipos e testes antes de partir para um superplanejamento”, analisa Bussacos. Os negócios sociais que atuam dessa maneira sabem quanto isso é útil para não perder recursos e não haver desperdício em nenhuma área –e, de quebra, também ajuda a t er mais insights.

Priorizar vivência de campo.

Bussacos acrescenta como imprescindível a vivência de campo. Segundo ele, somente uma postura teórica sobre o assunto, o que é muito frequente em ONGs, representa um grande risco. “O que acontece realmente lá na ponta? Uma visita de campo, o conhecimento das pessoas, uma conversa próxima a elas fazem muita diferença.”

Cocriar com o beneficiário.

Mais do que o público-alvo ter empatia com o produto ou serviço social que será formatado, Andrade sugere que o beneficiário seja cocriador. “É o ‘criar com’, em vez de ‘criar para’. Assim há maior engajamento e maior impacto”, garante ela.

Fazer uma governança com “dois olhos”.

Não há uma fórmula única de governança que se aplique a toda e qualquer inovação social, mas “um ponto comum é sempre estar com o olhar sobre os aspectos econômicos e sociais e avaliar cada caso”, como diz Bussacos. Segundo ele, rotineiramente, há momentos em que há a necessidade de gerar um impacto maior e outros em que o foco é obter um rendimento financeiro melhor.

“Mesmo os negócios sociais que alinham muito bem essas duas necessidades –por exemplo, um que ofereça um serviço de saúde, em que vender mais causa maior impacto social e financeiro– terão de pensar em precificação e precisarão definir o que fazer com as pessoas que não podem pagar nada”, justifica.

Bussacos acha salutar que as empresas envolvidas em negócios sociais revejam seu sistema de governança em face da balança de poder dos stakeholders. “Ao inovar na governança de uma organização, alteramos as relações de poder entre os públicos de interesse, questionando nosso modelo mental de como nos organizamos e nos relacionamos. Esse processo pode ser transformador e nos ajudar a gerar mais impacto social positivo e realizar ações que de fato transformem a sociedade”, diz.


O papel do Governo e o lucro

No Brasil, duas questões particularmente delicadas para uma atividade de inovação social dizem respeito ao papel do governo e à destinação dada ao lucro gerado, se for esse o caso.

Quanto ao governo, começa a haver um consenso: a parceria com o poder público continua a ser fundamental, mas, no que tange a recursos financeiros públicos, a prioridade é caminhar com as próprias pernas, dependendo o mínimo possível dele.

Na maioria das vezes, o Estado ainda se mostra indispensável na fase final de um projeto. Mas, segundo Bornhausen Sá, que também é presidente do Instituto Voluntários em Ação e idealizadora do Portal Voluntários Online, a preferência crescente é por, cada vez mais, não começar um projeto buscando recurso público.

Quanto ao lucro, ainda está para ser definido um parâmetro em relação a esse aspecto. Continua vivo o debate entre Muhammad Yunus, economista bengalês que é o principal acionista do Grameen Bank e considerado o “pai” do microcrédito, e Michael Chu, professor da Harvard Business School e diretor-gerente do Ignia Fund, baseado no México, além de sócio-fundador da Pegasus Capital, empresa de private equity na Argentina. Se o primeiro defende ardorosamente o reinvestimento do lucro na iniciativa social, o segundo prega a distribuição do lucro.

Evolução

Não restam dúvidas: a inovação social está se profissionalizando e evoluindo no Brasil, embora talvez não na velocidade necessária.

Segundo Bornhausen Sá, por exemplo, as startups ainda são mais propensas a investir em inovação social do que as companhias estabelecidas.

Para Bussacos, na maioria das cidades brasileiras o conceito é pouco difundido, embora centros como São Paulo, Rio de Janeiro, Curitiba, Florianópolis, Belo Horizonte e Recife já tenham várias iniciativas e negócios sociais mapeados.

O importante é que a inovação social vai deixando de ser compreendida como uma “bala de prata”, nas palavras de Bussacos. Mais e mais empreendedores do setor não creem em soluções mágicas, da mesma forma que não creem em vampiros, e preocupam-se em ter a tecnologia e o conhecimento adequados para conseguir planejar e executar uma inovação social. As 18 medidas aqui citadas confirmam o esforço.

Empreendedores inovadores

(Texto de Sílvio Anaz) – O Global Entrepreneurship Monitor examinou as características do empreendedor social. Entre os dados que se destacam estão a relativamente alta presença de mulheres e empreendedores sociais jovens e a diversidade da formação acadêmica e da trajetória profissional. Homens tendem mais a iniciar um empreendimento social, mas a diferença da iniciativa entre gêneros nos empreendimentos sociais não é tão alta quanto nos empreendimentos comerciais tradicionais.

A relação de gêneros varia de país para país. Por exemplo, na Malásia, Líbano, Rússia, Israel, Islândia e Argentina, as mulheres prevalecem sobre os homens. Nos Estados Unidos, Finlândia e China, a distribuição entre homens e mulheres é quase igual. Os homens são maioria no Brasil, Arábia Saudita, Marrocos e Bósnia, por exemplo.

Pelo mundo, pessoas com idade entre 25 e 44 anos têm a mais alta propensão a se envolver com empreendedorismo social. Isso indica que indivíduos que já estão estabelecidos mas ainda são jovens estão mais propensos a iniciar um empreendimento social. De outro lado, quanto mais perto da aposentadoria as pessoas estão, mais improvável é que iniciem uma empreitada dessa.

Ao examinar o nível educacional dos empreendedores sociais, o levantamento identifica a alta presença de indivíduos com nível superior; o engajamento com atividades de empreendedorismo social está, sim, relacionado com o nível educacional. Isso é especialmente verdadeiro para as economias com mais baixo nível de desenvolvimento, inclusive. No Brasil, levantamento da Ande Polo Brasil, Fundação Avina e Potencia Ventures mostrou que 78% dos empreendedores sociais têm curso superior. O mesmo levantamento indicou que quase 80% deles já tiveram outros empreendimentos.

O status mais comum da pessoa envolvida com o empreendedorismo social no mundo é o do profissional autônomo, seguido pelo que trabalha meio período, pelo estudante e por aquele que não trabalha.

No Brasil, as pesquisadoras Gilmara Tavares, Luiza Balduino, Tatiane Alexandre Silva e Vânia Nassif identificaram algumas características do perfil comportamental desse empreendedor: ele acredita na causa, ama o que faz, não tem preconceitos, trabalha sem querer nada em troca, gosta de planejar, estabelece metas, faz projetos na vida pessoal e profissional, gosta de conviver com as pessoas e orientá-las, é tolerante, compreensivo e determinado, aceita desafios.


Fonte: revista HSM Management, por Sandra Regina da Silva