A dinâmica das pastagens na Amazônia

Embrapa e INPE divulgaram o sumário executivo do projeto TerraClass que avaliou, para o ano de 2008, a ocupação das áreas desmatadas no Bioma Amazônia. Os resultados encontrados, embora sejam para uma data específica, nos permitem tirar várias e interessantes conclusões sobre a dinâmica das pastagens na Amazônia e da pecuária na região.

As pastagens são a classe produtiva de uso da terra que menos conhecemos no Brasil. A única fonte de dados estatísticos sobre área de pastagens no Brasil é o Censo Agropecuário. Os dados do Censo, no entanto, se referem a datas específicas, o que nos obriga a criar metodologias para estabelecer a dinâmica de evolução dos pastos no tempo. Foi a partir da publicação dos resultados do PROBIO que vários pesquisadores passaram a usar imagens de satélite para tentar quantificar a área ocupada com pastagens no Brasil.

Estivemos envolvidos em duas iniciativas que, a partir de mapas produzidos com os dados do PROBIO e de estudos que dele decorreram, estimaram a área ocupada com pastagens. Estes estudos nos levaram a concluir que o Censo Agropecuário de 2006 não tinha sido capaz de captar corretamente a área com pastagens, tendendo a subestimar a ocupação, sobretudo nos estados do Bioma Amazônia.

Isso significa que, se as áreas ocupadas com pastagens no Brasil são mesmo maiores do que aquelas apresentadas no Censo, o ganho de taxa de lotação observado entre 1996 (penúltimo Censo) e 2006 (último Censo) foi muito menor. Chegaríamos, assim, à conclusão de que o Censo nos leva a superestimar o ganho de produtividade da pecuária (se medida apenas como animais/ha). Os dados do TerraClass indicam que a ocupação com pastagens nos estados do bioma Amazônia está muito mais próxima dos dados do Censo do que os dois estudos em que participamos indicavam.

A tabela mostra que o Censo apontava 30 milhões de ha com pastagens no Bioma Amazônia (excluídos os estados do Maranhã e Tocantins). No primeiro trabalho no qual participamos, chegamos a um número de 52,5 milhões de ha. O mais recente trabalho de Sparovek chegou em 42,8 milhões de ha. Finalmente, os dados do TerraClass indicam 34 milhões de ha, muito mais próximos dos dados do Censo Agropecuário. Assim, embora seja verdade que o dado do Censo tende a subestimar a área com pastagens – lembrando que o dado do TerraClass se refere a 2008, e o do Censo a 2006 – o TerraClass confirma que essa subestimação é muito menor do que pensávamos. A mais importante implicação desta constatação é que os ganhos de taxa de lotação apontados pelo Censo estão corretos, diferentemente do que afirmamos em estudos anteriores.

Qual a razão da grande diferença observada entre o dado de Sparovek e do TerraClass? E como essa diferença ajuda a entender a dinâmica das pastagens na Amazônia?

A grande contribuição do estudo do TerraClass foi detalhar de forma mais precisa as classes de uso do solo na Amazônia. Não somente o projeto classificou áreas com pastagens em pasto limpo, pasto sujo e regeneração com pasto, mas também traz um número preciso de vegetação secundária que, certamente, são áreas de pastagens que foram abandonadas no passado. Quando somamos as quatro categorias, descobrimos que as diferenças, na maioria dos estados, são eliminadas.

No Pará, por exemplo, entre regeneração com pasto (um estágio anterior à vegetação secundária) e vegetação secundária, são 7,4 milhões de ha para uma área com pastagens de 12,9 milhões de ha. Estes dados mostram que existe uma parte da pecuária da Amazônia que ainda vive do ciclo de desmatar, exaurir a capacidade natural de suporte do pasto (ou seja, sem fazer qualquer investimento em manejo da pastagem) e, depois de alguns anos, migrar para outro lugar. Os dados do PRODES indicam que as taxas de desmatamento estão caindo ano a ano, comprovando que essa pecuária não investidora está perdendo força. Comparando a classe regeneração com pasto com o total de pastagem, observa-se que essa pecuária é uma minoria. No entanto, não se pode negar que ela continua a alimentar o processo de avanço da fronteira que acarretará, ao final de alguns anos, em um uso não produtivo da terra. É esse modelo de pecuária que precisa ser combatido na Amazônia para que o aumento da produção de carne ocorra apenas sobre os 34 milhões de ha já abertos e ocupados com pastagens de melhor qualidade.