Marketing e a era da administração

Diz-se, com certa frequência, que nós os seres humanos diferimos dos outros animais porque somos capazes de pensar. Talvez isso seja verdade, mas há outra diferença que é igualmente importante e que faz com que nossa sociedade evolua, tendo o progresso como mola mestra: essa diferença é a troca dos excedentes. Nenhum outro animal troca excedentes, só o ser humano. Quando os recursos são escassos, os animais lutam entre si por esses recursos, atitude que faz parte da natureza e serve para manter o equilíbrio do ecossistema. E como o marketing pode estudar esse comportamento entre os humanos?

Artigo publicado na edição brasileira do livro Administração de Marketing, de Philip Kotler. Autor: Marcos Cortez Campomar

O ser humano, por sua vez, além de lutar pelos recursos escassos, também luta para ter mercados para colocar seus excedentes em forma de troca. As guerras são causadas, principalmente, pelos interesses em recursos dos outros ou em mercados que servirão para colocação de excedentes. Os excedentes sempre foram criados pela natureza (na agricultura e na caça) ou pelos seres humanos com a construção de produtos artesanais.

A partir da Revolução Industrial, começaram a ser criados bens e serviços em grande escala, o que intensificou a existência de excedentes. O modelo globalizado, vigente no mundo de hoje, foi desenvolvido para evitar disputas. Se os recursos e mercados forem livres para todos, não haverá motivos para guerras.

A globalização ainda não está desenvolvida completamente e passou a ter um aspecto perverso, pois acirrou as disputas por mercados sem ter eliminado as guerras. O acirramento das disputas por mercados para colocação de excedentes obrigou empresas e países a desenvolverem competências para administrar os recursos e o atendimento aos mercados. É a era da Administração.

Surgiu então a figura do administrador, ser primordial no modelo globalizado. Nas organizações, no longo prazo, os profissionais que sobem na carreira acabam trabalhando em administração. Um engenheiro que começou exercendo atividades técnicas em uma empresa, ao ser promovido a um nível gerencial (tomador de decisões), passa a ser um administrador. O mesmo acontece a um médico ao passar a ser um diretor de um hospital, ele deixa de ser um médico e passa a ser um administrador. Mesmo um político, ao ser eleito para um cargo executivo, mesmo que continue a ser político, tem que tomar decisões administrativas.

As grandes empresas produtoras cresceram e a oferta de bens e serviços ficou muito maior do que a procura. Foi a partir da necessidade de administrar as relações de trocas com grandes quantidades de ofertas de produtos que surgiram as bases para a criação de uma nova área funcional

e também uma disciplina de estudo. Esta área e campo de estudo é o que é chamado de marketing. No Brasil, marketing, suas atividades e significados são objetos de confusão e más interpretações. A começar pelo próprio termo marketing, que no idioma original — o inglês — é de difícil tradução. Em especial por causa do sufixo “ing”, que é um gerúndio, que pode ser usado como substantivo e que denota ação. Assim, palavras terminadas em “ing” não são normalmente traduzidas por uma única palavra em português, sob pena de se criarem neologismos ou vocábulos pouco usuais. Este foi o caso de “mercadologia”, que poderia ser explicada como estudo de mercado e está longe de ser a tradução de marketing.

Marketing, portanto, é uma palavra usada no mundo inteiro e se refere à função administrativa, que cuida das trocas em uma organização, sendo também um campo de estudo específico.

Os estudos de marketing se referem a técnicas, teorias, modelos e processos, que devem permitir com que as ofertas feitas pelas organizações sejam feitas da melhor forma, provocando trocas que devem beneficiar tanto os ofertantes como os recebedores nesse processo, evitando que sejam causados, danos à sociedade como um todo.

Marketing está mais para arte do que para ciência, pois suas atividades dependem das competências e pendores daqueles que usam suas técnicas. As atividades de marketing referem-se: à obtenção de informações externas e internas de uma organização e à análise, das variações, das variáveis incontroláveis (econômicas, físicas, sociais, políticas, tecnológicas, etc.).

Referem-se também à identificação de grupos da sociedade que tenham comportamento e interesses semelhantes para que as ações sejam direcionadas a eles da melhor forma.

Marketing decide sobre as formas de atuação sobre as variáveis ditas controláveis. Marketing cuida também de como devem ser organizadas suas atividades, desenvolvendo estruturas administrativas próprias. Marketing cuida do planejamento e controle de todas as suas atividades.

O conceito de marketing evoluiu de ênfase nas vendas para ênfase no indivíduo consumidor e nos últimos tempos, o enfoque social desse conceito passou a enfatizar a preocupação com a sociedade. O uso das ferramentas de marketing não cria necessidades, mas desperta desejos quando existe uma necessidade latente e procura satisfazê-los. Pode-se dizer que com a ajuda do marketing, os seres humanos têm alcançado melhor qualidade de vida.


Sobre o autor desse artigo: Marcos Cortez Campomar é doutor e professor titular de Marketing da FEA/USP. Ele teve esse artigo publicado no livro Administração de Marketing, uma verdadeira bíblia do marketing que é publicada em vários idiomas. Esse livro é reconhecido como um “resumão” que todo estudante de Administração, Publicidade e Marketing deve ler e absorver. Esse artigo foi publicado nessa página apenas para efeito didático.