Havaianas: com o mundo aos seus pés

O que era uma commodity utilizada pelos mais pobres se tornou objeto do desejo de todas as classes sociais no mundo inteiro, graças a um exemplar programa de gerenciamento de marca. Vamos estudar o caso das Havaianas.

No exterior, as sandálias Havaianas de linha são comercializadas por até oito vezes seu preço original e as customizadas ultrapassam os US$ 100 por par. Entre 1997 e 2004, elas se tornaram uma das principais marcas globais do Brasil e fizeram com que sua fabricante, a São Paulo Alpargatas, tivesse sua ação valorizada em 325% em termos reais na Bolsa de Valores de São Paulo. Como isso aconteceu?

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Tudo começou em 1994, com um agressivo e inteligente plano de gerenciamento de marca, elaborado em resposta a uma forte queda nas vendas e na rentabilidade. Esse plano inclui três ondas: a da redefinição da estratégia em direção ao consumidor de classe média, a da consolidação do aprendizado com forte investimento no produto e na comunicação, e a da globalização e customização.

Elas são encontradas em canais de venda como a Saks Fifth Avenue de Nova York, a Selfridge’s de Londres e as Galeries Lafayette de Paris. Foram comparadas pelo jornal norte-americano Wall Street Journal e pela revista inglesa The Independent Review ao Boeing e ao Fusca, produtos que reinventaram suas categorias. E, embora já vendam quase 8 milhões de unidades por ano no exterior, em 63 países, ainda provocam filas de espera, e mesmo os produtos de linha são comercializados por até oito vezes seu preço.

Esses fatos de causar inveja a qualquer executivo do mundo se referem às sandálias de dedo Havaianas, fabricadas pela companhia brasileira São Paulo Alpargatas há mais de 40 anos e vendidas no Brasil a partir de R$ 5 o par. Hoje calçando celebridades como a atriz Nicole Kidman, a modelo Naomi Campbell e a princesa Stéphanie de Mônaco, elas se tornaram as estrelas de uma triunfante história de globalização de marca raramente vista em empresas da América Latina.

Os números da Alpargatas corroboram tudo isso: sua receita de vendas aumentou de R$ 586,6 milhões, em 1999, para R$ 919,6 milhões, em 2003, mesmo com o desaquecimento observado na economia brasileira durante aquele período; as exportações registraram crescimento de 37% em dólares apenas entre 2002 e 2003, alcançando uma participação de 5% no faturamento total; e o lucro líquido deu um impressionante salto de 71,5% no mesmo período, atingindo R$ 82 milhões.

Qual a participação das Havaianas nisso? Bem, elas respondem por cerca de 39% do faturamento da empresa. E como se explica o fenômeno? Gity Monsef, diretora de criação do Zandra Rhodes Museum, respeitado museu de moda de Londres, diz que as Havaianas são “a essência da simplicidade sexy” e ostentam “um design maravilhosamente clean”. A badalada butique Samantha, de Malibu, Califórnia, descobriu que elas têm qualidade muito superior quando as comparou com sandálias similares fabricadas na China e na Índia. Contudo, a explicação na linguagem do management pode ser outra: o notável trabalho de planejamento e gerenciamento de marcas realizado pela São Paulo Alpargatas.

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O novo gerenciamento da marca

O segredo mais bem guardado do Brasil depois da fórmula do guaraná Antarctica talvez seja o da borracha sintética que compõe as Havaianas. Não se entende bem por quê, mas, desde que foram lançadas, em 1962, essas sandálias efetivamente não deformam, não soltam as tiras e não têm cheiro, como diz um velho slogan da marca. Mesmo as concorrentes mais bem-sucedidas –como as sandálias Ipanema e Grendha, da Grendene– não conseguiram reproduzir a fórmula da borracha; elas trabalham com materiais como plástico e EVA.

Tais qualidades das Havaianas, no entanto, não foram suficientes para impedir que suas vendas anuais despencassem de 88 milhões de pares em 1988 para 65 milhões, mediante uma concorrência cada vez mais feroz. Tampouco evitaram que a rentabilidade da marca tomasse trajetória descendente. Foi o auge da associação da imagem das sandálias com as camadas mais pobres da população.

Nesse momento, a São Paulo Alpargatas tomou a decisão que mudaria a história das Havaianas. Como conta Paulo Lalli, diretor responsável pela unidade de negócios Havaianas envolvido no projeto desde o início, em 1994, as sandálias deixaram de ser tratadas pela empresa como meras commodities –quando todo o foco estava na redução dos custos de produção– e começaram a receber investimentos que lhes confeririam um valor agregado cada vez maior. “Mudamos o paradigma”, diz ele.

A marca passou a ser gerenciada de modo “agressivo” e, assim, teve seu ciclo de vida prolongado indefinidamente. Enquanto sua primeira “onda” das Havaianas –a de commodities– durou 32 anos, outras três ondas –distintas, mas que se sobrepõem– vêm ocorrendo há dez anos.

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Redefinição da estratégia, a segunda onda

Foi o lançamento da linha Havaianas Top, em 1994, que simbolizou a segunda onda da marca. Sua proposta era reconquistar a classe média. Se as Havaianas Tradicionais tinham sempre duas cores –solado e tiras numa cor básica, palmilha branca–, as Top vinham monocromáticas, em cores da moda. “Com as Havaianas Top, queríamos principalmente agregar a idéia do conforto emocional à mensagem de conforto físico que já era transmitida pela marca”, diz Lalli.

Mas esse foi apenas um aspecto do reposicionamento. Para que tudo funcionasse bem, era necessário fazer para as sandálias Top uma distribuição diferente daquela das Tradicionais. Um número significativo de varejistas de calçados aderiu à idéia de comercializar a nova linha, mediante a promessa de receber todo o apoio possível da Alpargatas. Foram criadas embalagens para as Top (as Havaianas Tradicionais eram vendidas soltas, como se fossem pneus) e displays para expô-las de forma destacada nos pontos-de-venda (para que não ficassem dentro de caixas de sabão em pó, como muitas vezes acontecia com as Tradicionais).

O tempo da publicidade das Havaianas na televisão não cresceu – continuou sendo veiculada no primeiro e no último trimestres do ano –, mas se modificou. Com sua agência de publicidade, a Almap BBDO, a Alpargatas decidiu tirar o foco do produto e colocá-lo no usuário. E era preciso fazer isso com credibilidade e de forma divertida, o que levou à escolha de uma peça testemunhal. Resultado: Malu Mader, uma das atrizes brasileiras mais associadas ao ideal de elegância, protagonizou uma peça institucional da marca em que calçava sandálias Havaianas (dentro de casa).

“Já no primeiro ano atingimos nossos objetivos. As Havaianas Tradicionais recuperaram volume de vendas e a linha Top, embora com receita baixa em comparação à das Tradicionais, recebeu uma resposta bastante positiva do mercado, com exposição espontânea na mídia e aceitação pelas lojas especializadas”, comenta Lalli. Animada, a empresa continuou investindo na nova estratégia. Estava tão animada que, quando fez as contas, constatou que reinvestiu 100% do faturamento obtido com as Havaianas Top.

Consolidação do aprendizado, a terceira onda

As Havaianas Tradicionais sempre tiveram a fama de oferecer excelente relação custo–benefício a seus usuários. Em 1997, a Alpargatas se propôs fazer com que o valor percebido das Havaianas Top obtivesse a mesma reputação. Se as Havaianas Tradicionais eram muito baratas para os consumidores de renda mais baixa, as Havaianas Top (e os outros modelos mais sofisticados que surgiriam) também o eram para os usuários de classe média. Para transmitir essa idéia, a Alpargatas potencializou o que já vinha aprendendo em duas frentes: produto e comunicação.

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Produto

De dona de uma única linha de produtos durante 32 anos, a marca Havaianas passou a ter mais de 25 linhas entre 1997 e hoje, destinadas a diferentes segmentos do mercado de renda mais elevada, com preço até seis vezes superior ao das Havaianas Tradicionais. Sua gama de cores ficou cada vez mais forte –o que é comprovado por tons fashion como o rosa-chiclete, o menta, o pistache e o ultravioleta–, surgiram estampas e foram elaborados novos formatos.

Dificilmente seria viável implementar tanta inovação se a Alpargatas não tivesse decidido se tornar uma companhia de marcas, mudando de uma estrutura baseada em funções para outra organizada em unidades de negócios. Em 1997, portanto, as Havaianas se converteram em uma unidade de negócios independente, com 3,2 mil dos 11 mil funcionários da Alpargatas. Isso alinhou as áreas de marketing, vendas, desenvolvimento de produtos e fábrica, conferindo velocidade a todas as iniciativas relativas ao produto.

Outra mudança relevante ocorreu na fábrica, localizada na cidade de Campina Grande, na Paraíba, que deixou de ser orientada para a produção e passou a orientar-se para o mercado. Novos equipamentos (alguns feitos por encomenda) foram adquiridos para que os lotes pudessem ser menores e o processo mais ágil, e os funcionários receberam treinamento para se adaptar à nova mentalidade. O resultado foi a venda de 111 milhões de pares em 2003 e de 130 milhões em 2004.

Por sua vez, o centro de armazenagem, até então organizado horizontalmente, se tornou verticalizado, como um prédio de apartamentos –o que fez com que a capacidade de armazenagem crescesse de 44 SKUs (do inglês stock-keeping unit, unidade de armazenagem de produtos) anuais, em 1994, para 5.236 SKUs, em 2004. E montou-se um moderno laboratório para o desenvolvimento de cores.

A estratégia de distribuição recebeu cuidado especial. Além de a marca ganhar distribuidores regionais quase exclusivos, que lhe dispensam maior atenção, a distribuição dos lançamentos mereceu tratamento diferenciado. Afinal, apesar da segmentação, as Havaianas não deveriam restringir-se aos canais de venda mais sofisticados; os canais populares continuavam sendo importantes.

“Criamos a estratégia de lançar os novos modelos nos canais formadores de opinião e, quando eles estivessem bem conhecidos, nós os colocaríamos também nos atacadistas. Precisamos ter bastante disciplina para dizer ‘não’ aos canais de massa, mas hoje todos entendem que isso funciona melhor”, explica Lalli. O intervalo de colocação entre os canais está encurtando à medida que o ciclo das sandálias fica mais rápido: enquanto as Havaianas Top levaram três anos para passar do canal sofisticado ao de massa, as Havaianas Trekking, por exemplo, fizeram a transição em apenas um ano.

Comunicação

Pode-se traduzir o reforço na comunicação das Havaianas em números: entre 1994 e 2003, a verba para isso aumentou de 3% a 4% das vendas para algo entre 10% e 12% (sendo que as vendas cresceram muito). E, em vez de veicular campanhas apenas nas temporadas, a decisão foi estar presente na mídia eletrônica nos 12 meses do ano.

No entanto, a mudança da abordagem talvez seja o aspecto mais significativo da nova comunicação da marca. Em primeiro lugar, os executivos da Alpargatas se conscientizaram de que o trabalho de comunicação deveria basear-se em contar, de maneira eficaz, a história da marca para as pessoas. “Segundo o especialista norte-americano Howard Gardner, essa é a chave para a liderança de marca”, observa Lalli. Em segundo lugar, a mídia impressa ganhou importância no mix de publicidade e passou a ser utilizada para apresentar as novas linhas a um público formador de opinião. Em terceiro, os trabalhos de assessoria de imprensa, relações públicas e promoção de eventos receberam a mesma prioridade da publicidade.

A campanha institucional na mídia eletrônica seguiu o tema “Todo mundo usa Havaianas”. Nela, o ator cômico Luiz Fernando Guimarães flagrava celebridades como Vera Fischer e Maurício Mattar calçando as sandálias em lugares públicos, e não mais apenas em casa.

Em paralelo, as áreas de assessoria de imprensa, promoção de eventos e RP “garantiam” que todo mundo realmente usasse Havaianas, conferindo credibilidade à mensagem. Limitando-se a poucos exemplos, entre 2002 e 2003, a assessoria de imprensa das Havaianas inspirou um editorial de moda inteiro com as sandálias na revista Capricho –a principal publicação teen do Brasil–, a promoção de eventos distribuía Havaianas tanto em camarotes VIP dos carnavais de Salvador e do Rio de Janeiro como no principal desfile de moda do País, a São Paulo Fashion Week, e o pessoal de RP enviava Havaianas de presente a um mailing de celebridades.

Completaram essas iniciativas a continuidade do bom trabalho com os pontos-devenda –a empresa até criou o “planograma” para orientá-los sobre a melhor exposição das sandálias– e o lançamento do site oficial, www.havaianas.com.br, com versões em português, inglês e espanhol. Nele os usuários podem conhecer a coleção detalhadamente e encontrar a loja mais próxima de sua casa, estejam eles na África, na Ásia ou na América do Sul. Curiosamente, as Havaianas “têm” um segundo site, sustentado por fãs: www.havaianasfetiche.com.br.

Internacionalização e exclusividade, a quarta onda

Hoje, norte-americanos, ingleses e australianos descolados sabem dizer qual é a marca de suas flip-flops, the Brazilian “ra-VYAH-nas”. A exportação, que se iniciou em 1994 para alguns países da América do Sul, decolou a partir de 2001, como conta a diretora de exportação Ângela Hirata, com a abordagem de exportar a marca. Foi catapultada por um país formador de opinião na área de moda, a França, em uma mostra sobre a América Latina nas Galeries Lafayette, em Paris, às vésperas do verão europeu.

Atualmente, as sandálias estão muito bem distribuídas em lojas e butiques sofisticadas do exterior –onde não são encontradas em supermercados. Seu preço médio gira entre 25 e 30 euros na Europa e entre US$ 10 e US$ 15 nos EUA, valor significativamente superior ao do modelo mais caro da marca no Brasil, as Havaianas High (com solado anabela), que aqui custam cerca de R$ 35. Seus maiores compradores são Estados Unidos, Austrália, França e Espanha.

Na verdade, as Havaianas souberam ocupar um espaço que estava vazio no mercado mundial. Como declarou Rui Porto, diretor de comunicação e mídia da São Paulo Alpargatas, ao Wall Street Journal: “Não havia uma marca global de sandálias. Agora há: Havaianas”. Essa “ocupação” se baseia em quatro pilares, segundo Paulo Lalli: pessoas, promoção de eventos, assessoria de imprensa e projetos especiais com as lojas. Leia-se “pessoas” de dois modos: refere-se tanto à equipe interna, que sabe mostrar o alto valor agregado das sandálias no exterior, como aos distribuidores em cada país.

Teve de haver muito aprendizado no que se refere aos distribuidores. Em um primeiro momento, os distribuidores eram selecionados por seu conhecimento do varejo local –não funcionou tão bem. Então, eles passaram a ser escolhidos por sua visão de marketing, sua capacidade de assessoria de imprensa e seu relacionamento com os formadores de opinião locais. O resultado não poderia ser melhor.

Por exemplo, em 2003, a distribuição de Havaianas nos principais prêmios mundiais do cinema e da música, o Oscar e o Grammy, só foi possível porque o revendedor norteamericano das sandálias tinha acesso aos produtores dos eventos. Do mesmo modo, os editoriais de moda das Havaianas na revista Elle francesa e na Cosmopolitan norte-americana foram fruto do esforço da assessoria de imprensa dos distribuidores daqueles países. E as vitrines de Havaianas que ocuparam por quatro semanas a loja Au Printemps, de Paris, não foram um aluguel pago pela Alpargatas, mas um projeto especial em parceria arquitetado pelo distribuidor francês, que sabia que a famosa loja procurava uma forma diferente de sinalizar a chegada da primavera.

A globalização é um dos caminhos para o futuro da marca Havaianas. A meta da unidade de negócios é que, nos próximos cinco anos, as exportações respondam por 15% do faturamento total, e este deve continuar crescendo em ritmo acelerado (os números não são divulgados, contudo). “O estágio agora é o de manter o posicionamento alcançado pela marca no exterior e aumentar o volume de vendas”, diz Lalli.

Outro caminho promissor é o da customização em massa, que oferece exclusividade –e maior valor agregado– ao consumidor. A empresa já tem boas experiências em customização. Por exemplo, ela fabrica Havaianas com design exclusivo para butiques –como a renomada Daslu, em São Paulo, e a Samantha, de Malibu– que chegam a ser vendidas a mais de US$ 100 o par. Também produziu sandálias sob medida para o Morumbi Shopping, de São Paulo, como promoção de Natal para quem acumulasse mais de R$ 200 em compras; saíram mais de 200 mil pares. E a Alpargatas fabrica pares sob medida para casamentos, a partir de 300 pares; os noivos presenteiam os convidados com as sandálias para que estes possam dançar à vontade.

A questão é como a empresa fará a customização de modo mais rotineiro, massivo e com menores custos. Um ensaio nesse campo foi o evento “Monte suas Havaianas” em 2003, que durou um mês: foram instalados quiosques em lojas de centros comerciais do Recife e Rio de Janeiro onde as consumidoras podiam criar a(s) sandália(s) que melhor complementava(m) seu guarda-roupa. Montar par por par fica muito caro? “Caro é o que não vende”, responde Lalli. O desafio para customizar em massa, analisa o executivo, é quebrar mais um paradigma –e, dessa vez, não da empresa, mas de todo o setor calçadista.

Ícone da cultura pop (e da Bovespa)

O novo programa de gerenciamento da marca Havaianas gerou grande valor para os acionistas da São Paulo Alpargatas. Fez com que as ações da empresa registrassem uma valorização nominal de 553% na Bolsa de Valores de São Paulo entre 30 de setembro de 1997 e 30 de setembro de 2004 –e de 325% se descontada a inflação. Provavelmente também representou um empurrão a mais para que o poderoso grupo Camargo Corrêa adquirisse o controle da companhia. O fato é que, algum tempo atrás, ninguém diria que as mulheres combinariam a cor das unhas com as Havaianas que estivessem calçando no dia. Tampouco sonharia que todas as modelos de um desfile do estilista Jean-Paul Gaultier em Paris teriam Havaianas nos pés. Em apenas dez anos, essas sandálias de dedo viraram um ícone cult da cultura pop mundial. Quem pode dizer o que acontecerá nos próximos dez anos?

Duas coisas, contudo, parecem certas. A primeira: a comunicação eficaz da história das Havaianas vai continuar. A segunda: com essas sandálias, só se pode andar para a frente também (literalmente; quem andar de ré tropeçará).

A ligação com a marca Brasil

As Havaianas talvez tenham sabido capitalizar como nenhuma outra marca as imagens positivas do Brasil no mundo. Como escreveu um jornalista da revista The Independent Review, de Londres, com essas sandálias nos pés, “podemos estar andando nas ruas das cidades, mas estamos sonhando com a praia”. E ele completou: “Você desliza num par de Havaianas e, de algum modo inde. nível, torna-se um brasileiro honorário”. “Nossas sandálias são realmente vistas como alegres e coloridas, características bem brasileiras”, confirma Paulo Lalli, diretor da unidade de negócios Havaianas. Se a primeira versão das sandálias já era naturalmente associada a imagens do País como praia, calor e descontração, as novas versões aprofundaram a ligação. A começar pelo tom geral da comunicação da marca, segundo a qual elas constituem um item de moda que calça todos os brasileiros, das top models aos membros do Movimento dos Sem-Terra. A natureza tropical, um dos atributos mais famosos do Brasil, também inspirou várias linhas da marca, como Floral, Flower, Hibisco, Butterfly e Ipê. As Havaianas Trekking –papetes– remetem a caminhadas por trilhas no meio da mata que conduzem a cachoeiras, algo muito comum no Brasil. Voltadas para o público masculino, as Havaianas Surf mostram ligação natural com um país que conta com 7,3 mil quilômetros de praias. E não se pode deixar de citar, é claro, a linha Havaianas Brasil, que traz as cores da bandeira nacional

Uma estratégia difícil de imitar

Tornar-se difícil de imitar. Esse é o conselho do especialista em estratégia Michael Porter e dos mestres em marketing Jack Trout, Al Ries e Philip Kotler para todas as empresas. Os quatro reclamam que poucas fazem isso realmente, mas a unidade de negócios Havaianas poderia facilmente ser citada por eles como um exemplo a seguir. Como as Havaianas são difíceis de imitar se há tantas imitações suas no mercado? Esse é justamente seu diferencial. Nenhuma das imitações conseguiu até agora ter sua qualidade com seu preço e seu apelo de item fashion. Entre as receitas de Porter, Trout, Ries e Kotler que podem ser observadas destacam-se: Posicionamento – A Alpargatas percebeu que a queda de vendas das Havaianas era decorrência de seu posicionamento popular. Então, reposicionou-as, como recomendam Trout e Ries, de forma a transformar o popular em democrático e informal. Cadeia de valor diferenciada – A Alpargatas alterou a cadeia de valor das sandálias e passou a distribuílas em lojas varejistas especializadas. No exterior, isso até incluiu o doloroso trade-off recomendado por Porter: a Alpargatas recusou a possibilidade de vender grandes volumes a redes de hipermercados para manter um posicionamento premium. Comunicação eficaz – A melhor publicidade é ter os outros falando de sua marca. Por isso, diz Kotler, assessoria de imprensa e relações públicas são fundamentais para uma marca. Estratégia duradoura – Segundo Porter, uma vez definida, a estratégia precisa ser estável para ter efeito. A marca Havaianas segue hoje a mesma estratégia traçada em 1994.

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Cronologia das Havaianas

1907: O escocês Robert Fraser, vindo da Argentina, se associa com um grupo inglês e abre uma fábrica de alpargatas, calçado bom e barato indicado para as colheitas de café.

1962: A fábrica lança um calçado com conceito similar ao das alpargatas, para consumidores de baixa renda: as sandálias de dedo, inspiradas nos chinelos japoneses.

1965: As Havaianas r apidamente atingem a marca de mil pares vendidos por dia. São expostas em caixas de papelão nos mercados de bairro.

1970: Multiplicam-se suas imitações e surgem as campanhas protagonizadas pelo comediante Chico Anysio, que proclama as Havaianas como “as legítimas”.

1994: Com queda nas vendas e na rentabilidade, a marca Havaianas começa a ser revitalizada com o lançamento das monocromáticas Havaianas Top, para atingir os consumidores de renda mais elevada.

1995: Além de vendidas também em lojas especializadas, as Havaianas passam a ser expostas de modo diferenciado.

1996: A nova e elegante publicidade das Havaianas é veiculada também na mídia impressa, para atingir novos segmentos de público.

1998: Novas linhas e modelos não param de ser incorporados à família, como as Havaianas Brasil, aproveitando a Copa do Mundo de Futebol de 1998, na França.

2000: Celebridades como a top model Gisele Bündchen são fotografadas calçando Havaianas.

2001: Embora as sandálias fossem exportadas desde 1994, a abordagem de exportar a marca Havaianas ganha impulso agora.

2002: As Havaianas se tornam mania nacional e internacional. São estampadas nas páginas de grandes veículos de comunicação mundiais. As Havaianas ocupam algumas das vitrines mais concorridas do planeta. A Alpargatas coloca suas sandálias em alguns dos eventos mais prestigiados do Brasil e do mundo, como a São Paulo Fashion Week e o Oscar.


Fonte: A reportagem é de Adriana Salles Gomes, foi publicada na revista HSM Management.