As Marcas e a Sociedade

Esse é um trecho do livro Pró Logo, em que os autores Michel Chevalier e Gérald Mazzalovo fazem um contraponto ao livro No Logo, de Naomi Klein, ao destacar as virtudes do gerenciamento de marcas que buscam participar da construção de uma sociedade mais justa através do fortalecimento de valores sociais agregados à marca.

marcas e a sociedade

Quando pensamos na presença das marcas em nossa sociedade contemporânea, a primeira ideia que vem á mente não é a qualidade dos produtos, mas a intensidade das mensagens.

As marcas existem somente porque podemos reconhecê-las. E as reconhecemos porque percebemos as mensagens que enviam, suas especialidades e uma certa constância ao longo do tempo. Neste livro, vamos mencionar esses componentes: comunicação, diferenciação e duração.

A dimensão comunicativa das marcas opera de duas maneiras. Primeiro, a marca envia suas mensagens aos consumidores almejados. Inicialmente se estabelece um relacionamento forçado e por meio de uma grande rede, para ter certeza de captar os consumidores pretendidos. Segundo , alguns sinais e símbolos, como  o dinheiro, circulam. As marcas também circulam e se reproduzem socialmente.

Vamos imaginar e a reação de extraterrestres que cheguem ao Times Saqure, em Nova York, no bairro Ginza, em Tóquio, ou na via Montenapoleone, em Milão. Os logotipos e nomes de marcas nos edifícios e as roupas vestidas pelas pessoas provavelmente causarariam impacto, á primeira vista, pela forma exagerada de cores, tamanhos e formas de letra, desenhos, imagens. Aqueles seres descobririam uma civilização em que as marcas desempenham um papel importante na comunicação social. Também descobririam , ao comparar lugares diferentes, o grande número de marcas globais, sua presença sistemática nas ruas de comércio mais famosas e a homogeneidade visível que elas impõem nos estilos de vida.

As três listas ou símbolo nos tênis para corrida, o jogador de polo bordado em uma camisa, o “símbolo” associado a um som “no boné” a bolsa Kelly, o carro que alguém dirige ou os restaurantes que se frequenta muitas vezes dizem mais sobre a personalidade do indivíduo do que seu currículo profissional.

Em uma sociedade caracterizada pelo crescimento espontâneo da comunicação, em todas as suas formas e conteúdos, percebe-se o fato de as marcas estarem no centro da vida contemporânea. Elas orientam as compras que realizamos, influenciam nossos julgamentos sobre produtos e pessoas e nos forçam a ter uma posição em relação a valores comunicados (ou contravalores ou mesmo a ausência de valores).
Esses efeitos não se limitam ao momento isolado da comunicação (o outdoor ou o comercial de TV vistos de relance). O modo como as marcas circulam, são copiadas, exibidas ou apreendida revela a extensão e a profundidade com que afetam a nossa sociedade. Na realidade elas têm mudado nossa maneira de pensar e de viver.

Primeiro, contribuíram consideravelmente para a transformação de nossas paisagens urbanas, ocupando parcela visível do espaço comercial e de comunicação. Além disso, marcas transmitem valores. A identidade da marca é feita de elementos constantes que expressam uma visão do mundo, valores em que se acredita e que se tenta promover. A Nike busca a excelência no desempenho atlético; a Hermes, na vida aristocrática; a Armani visa á elegância tranquila em estilo italiano.

As marcas nos obrigam, por meio de sua presença nos circuitos comerciais, a posicionar-nos em relação a valores transmitidos. A oferta de produtos e os valores a eles associados têm crescido fortemente nos últimos anos, dando-nos oportunidades que nossos pais jamais poderiam ter sonhado. Podemos escolher estilos de vida temporários, conforme nossa conveniência, e refletir sobre nosso estado de espírito no modo como consumidores.

E, finalmente, as marcas vêm ando a oportunidade de estabelecer ações de solidariedade. Seja sob a influência dos consumidores ou sob a liderança de gerentes empresariais, as marcas têm aumentado consideravelmente seus compromissos com diversas causas sociais e de interesse geral. Mais adiante retomaremos esse assunto, tratando de mecanismo e consequências de tais ações. Veremos que os compromissos e ações sociais de empresas estão ligados á dimensão comunicativa das marcas. Por ora, nesse estágio inicial de nosso estudo, apenas mencionamos esses efeitos tangíveis em nossa sociedade.

A Marca e seus Signos

Com essas análises iniciais tentamos caracterizar o quadro de discussões sobre marcas. Quais são os sinais por meio dos quais a marca se afirma? Na realidade, são de diversas ordens, embora muitas vezes inter-relacionadas. Para se expressar, a marca usas elementos diferentes e complementares.

A começar pelo próprio nome. A logomarca, uma parte inevitável de nossas paisagens urbanas hoje, é o que vem á mente de imediato. No entanto, o nome, em sua dimensão “literal” e sonora, também merece uma atenção cuidadosa.

Nomes de Marcas

O nome constitui o primeiro sinal de reconhecimento de uma marca. Ele nunca é neutro e sua escolha não deve ser deixada ao acaso. Como prova de sua importância, muitas vezes, na história das principais marcas, o nome foi simplificado. Por exemplo: Quando a marca levava o nome de seu fundador, em alguma ocasião o pronome foi abandonado (Ford, Johnson, Hoover, Philips). Ou  o nome foi reduzido á sua sigla (IBM, BMW). Pode ainda ter eliminado elementos que ofereciam pistas e detalhes do nome da empresa; “Source Perrier” tornou-se simplesmente “Perrier” e “The Great Atlantic and Pacific Tea Companhy”, “A&P”.

A marca também pode optar por um nome mais coloquial, informal. Os gerentes da marca Gap Generation, compreendendo que seus produtos eram chamados simplesmente de “Gap” por seus consumidores, tiraram o “Generation” das etiquetas.

A Coca-Cola, já em 1941, também adotou a abreviação “Coke”. Só não mudou definitivamente de nome porque a abreviação “Coke” também designa cocaína na gíria inglesa,; por causa também do escândalo na década de 1980, com Cherry Coke ter fracassado.

No início do século XX, muitas marcas receberam o prenome e o sobrenome de seus fundadores. Em certas ocasiões elas tentaram livrar-se do nome, para sobreviver á morte do criador. Algumas vezes também tiveram sucesso em assimilar um valor vinculado á personalidade do fundador, originado uma identidade duradoura. Os casos mais emblemáticos são os dos automóveis Henry Ford e o da Walt Disney Company, que simplificam o nome de sua marca, mas perpetuam a memória de seu fundador em sua comunicação interna e externa.

O carisma e a reputação dessas figuras históricas são fatores de peso em tais escolhas. Pode-se perceber também que o nome de uma pessoa introduz um elemento humano reconfortante no relacionamento entre a marca e o consumidor. E é nesse aspecto que a marca retorna á sua dimensão mais primitiva: a de um compromisso pessoal da parte do fornecedor.

Para os produtos de luxo, o primeiro nome, por identificar o criador permanece uma parte indispensável da excelência e da criatividade da marca. Saint Laurent nunca vêm á mente sem Yves, ou Ferragamo, sem Salvatore. Entretanto, há exceções, como é o caso da marca Gucci, cujo fundador se chama Guccio, mostrando, assim, uma obliteração deselegante. Coco Chanel também sempre preferiu usar somente os eu sobrenome.

Quando o nome de uma marca passa a fazer parte da memória coletiva, é preciso cuidado com as mudanças. Estas nem sempre são recomendadas. A mudança da marca Marcel Rochas para Rochas não trouxe nenhuma sorte para o negócio. No início dos anos 1990 foi feita uma tentativa para recolocar o pré-nome, abrindo uma loja, em Paris, de trajes masculinos. Tal loja foi denominada Marcelo Rochas, mas a tentativa logo foi abandonada.

Na área de gerenciamento de nomes de marca, um dos fenômenos mais interessantes a serem observados atualmente é o desaparecimento progressivo do prenome de Christian Dior. Até 1995, os produtos e a propaganda sempre levavam a assinatura completa. Então o prenome “Christian” foi desaparecendo progressivamente. Durante um longo tempo foi mostrado de modo simplificado na propaganda, mas inteiro na parte inferior do anúncio e nas embalagens. Hoje é cada vez mais comum a marca aparecer sem o pré-nome, em símbolo de novas lojas e em todo o material de propaganda.

Como devemos encarar esse fato? Alguns pensarão que os diretores da companhia estão se arriscando e podem diminuir progressivamente o componente afetivo da marca, separando-o de suas raízes. Porém, os excelentes resultados da marca até agora parecem provar o contrário. O futuro dirá.

Na história da criação das marcas, o nome dos fundadores e a origem regional (como Pittsburgh Plate Glass) transformaram-se aos poucos em nomes mais simbólicos, poéticos. É o caso de fabricantes de perfumes,que deram o tom nos anos 1990: Shalimar (Guerlain, 1925), Shocking (Schiaparelli, 1931).

Na década de 1930 a importância do nome atribuído a novos produtos tornou-se uma preocupação do setor de bens de consumo como um todo. Buscaram-se neologismo compostos, com o objetivo de evocar as qualidades, concretas e abstratas, do produto. Muitas vezes esse neologismo se estende á própria marca do produto. Para armazenar alimentos congelados, Frigidaire; para um amaciante de tecidos, Snuggle; para um lençol de papel, kleenex. A meta consiste em criar nomes que sejam facilmente retidos, plenos de significado e poderosos.

Essa preocupação crescente com um nome que ecoava alguma qualidade do produto leva a um distanciamento gradual da realidade concreta da empresa e de seu setor industrial.

Para um fabricante de perfumes, destacar um elemento imaginário pode parecer natural e comum. No caso da Apple Computers, em 1976 isso representava inovação, – pois se tratava de um meio dominado por siglas e onde despontava a venerável Internacional Business Machines (IBM).

A abreviação e junção de termos – como “Microsoft (de – “microcomputador” e “software”) – fazem parte da mesma tendência: desmistificar e causar impacto da marca. O nome havia consolidado um valor, um “espírito da marca”, mais do que as qualidades do produto ou do serviço.

A ruptura com as características reais do setor chegou a incluir a invenção de nomes fictícios. Eram nomes plausíveis, nos quais o neologismo não era visível e que visível e que apresentavam voltar a uma origem do produto. Podemos citar a marca Hãagen Dazs remete (falsamente) à Escandinávia; Sony sugere uma marca internacional; Bridgestone deriva de um sobrenome japonês.

O fenômeno da concentração de marcas em anos recentes tem sido acompanhado pelo surgimento de duas tendências. A primeira refere-se ao fato de as empresas com imagem séria e conservadora (em particular no setor bancário europeu) voltaram-se a evocação. A segunda diz respeito aos nomes escolhidos, os neologismos, com uma preocupação para a neutralidade geográfica e uma certa tendência para a abstração: São palavras que frequentemente remetem á Grécia Antiga dos filósofos: a identidade da marca passou da realidade para o conceito. O nome não tem mais relação com um fundador, uma região ou com as qualidades do produto ou serviço. Como um neologismo, o nome celebra a criatividade. Dexia, Natexis e Thales são exemplos dessa categoria.

A escolha também poder ser motivada por questões mais pragmáticas. Por exemplo, encontrar um nome que ainda não foi usado ou registrado. Também observamos que, ao inventar um nome, existe a vantagem de escolher um que posiciona a companhia bem no alto ou bem baixo na lista de cotação das ações. Após o precursor, Axa, notamos o aparecimento de Vivendi, Vivarte e Areva.

O caso da Accenture merece atenção. Quando as duas companhias – Arthur Andersen (empresa de contabilidade e auditoria) e a Anderson consulting (empresa de consultoria empresarial) – foram separadas, os tribunais forçaram a última a mudar seu nome. Um concurso foi promovido entre os empregados para obter sugestões. O novo nome tinha de iniciar com “A” e a segunda letra tinha de ser anterior a “N” (no prenome Andersen). Desse modo, os clientes que procuram a Anderson Consulting na lista telefônica, ou na internet, encontra-se a nova marca um pouco mais acima na lista. Também tinha de ter quase o mesmo número de letras que “Andersen”, para lembrar esse nome. Um empregado escandinavo sugeriu “Accenture”, um misto de “acento”, “aventura” e o AC, de “Andersen Consulting”.

Em síntese, não existe um nome ideal. Caso existisse, seria o nome de uma pessoa, fácil de lembrar em todas línguas, que evocasse as qualidades do produto ou serviço oferecido, sugerisse a filosofia da companhia, conotasse inteligência e criatividade e começasse com a letra “A” ou “Z”, para ter destaque nas listas de cotação das ações.

O nome constitui um ativo vital. Ele é uma fonte de muita preocupação e de enormes investimentos para as companhias. Podemos afirmar que um nome bem escolhido possui duas características: é fácil de lembrar e envolve um componente emocional ou um elemento racional. Nos dois casos, encontramos o melhor e o pior. Porém, tais julgamentos implicam alto grau de subjetividade. Por essa razão, não vamos nos atrever a dar exemplos. Lembramo-nos do discurso amoroso de Julieta, na obra de Shaspeare: “O que existe em um nome? / Aquilo que chamamos uma rosa / Por qualquer outro nome teria o mesmo aroma doce”. Isso pode ser válido para o nome de uma flor, mas certamente não para o nome de uma marca.